Os Protocolos dos Sábios do Sião
Uma nefasta farsa intitulada «Os Protocolos dos Sábios do Sião» (adiante designados por PSS) desempenhou um papel determinante na consolidação do anti-semitismo na era Industrial, já que deu “legitimidade” ideológica a muitos carrascos xenófobos para definirem os Pogroms e as campanhas de aniquilamento de judeus que culminaram no holocausto nazi.
Os PSS foram forjados pela Okhrana (a polícia secreta da Rússia czarista) e referem-se a uma alegada (e completamente fictícia) reunião clandestina de líderes judeus em Basileia (Suiça) no ano de 1897, pretendendo reproduzir as respectivas actas que constituem 24 discursos correspondentes a outros tantos passos na sua sinistra estratégia para dominarem o mundo, em que, vestindo a pele de cordeiros, fomentam a desordem, o descrédito das instituições que representam o poder ligadas aos cristianismo, até que um déspota semita assumisse as rédeas da política, da economia e da religião global.
Os seus falsificadores pretenderam imprimir alguma credibilidade a este pseudo documento acrescentando-lhe nomes verdadeiros de figuras públicas e eventos mediáticos a que estas estiveram associadas. Assim, convenientemente, a Okhrana atribuiu a autoria dos protocolos ao Concelho de Sábios do Sião liderados por Theodor Herzl, fazendo coincidir a data dos falsos documentos com o Congresso de Basileia. Aí, efectivamente, reuniram-se 204 delegados judeus de várias nacionalidades, com o propósito de fortalecer o movimento político sionista, como um poderoso lóbi que deveria garantir ao seu povo um regresso maciço à “terra prometida” na Palestina.
Ao contrário do que os difamadores anti-semitas querem fazer crer, essa reunião nada teve de secreta, sendo aberta ao público interessado e a imprensa foi convidada a assistir.
Os PSS foram editados pela primeira vez de forma clandestina e apócrifa em 1897, sendo redigidos em francês, o que reforça as suspeitas de que o texto foi adaptado, adulterado e divulgado por Piotr Ivanovich Rachkovskii, o chefe da delegação francesa (sedeada em Paris) da Okhrana, que era useiro e vezeiro na publicação de folhetos intriguistas a par da sua perseguição implacável aos emigrantes russos em solo francês. São conhecidos outros oprobiosos folhetos e opúsculos que, recorrendo à mesma fórmula que seria empregue nos PSS, Rachkovskii tinha posto os seus homens a distribuir aos incautos populares.(Há, por exemplo, um de 1892 que pretende denunciar os perigos da anarquia e do niilismo.)
Em 1903 os PSS foram publicados no jornal de S. Petesburgo, cujo director (um fascista anti-semita) “abalizou” a sua “autenticidade”.
(Logo em 1898 um russo, cuja identidade se presume ser Mathieu Golovinski, tentou, sem grande sucesso, usar os PSS, como parte da sua estratégia para destilar ódio por toda a sociedade russa contra os judeus, K. Marx, C. Darwin, F. Nietzche…)
A sua versão integral compilada em forma de livro (integrados num tomo intitulado « O Grandioso dentro do Pequeno») surgiu em 1905, da autoria do professor Segei Nilus que era um cristão ortodoxo muito próximo do czar Nicolau II, e temia a laicização da sociedade preconizada pela ameaça bolchevique e pelo guru do ateísmo político, Karl Marx, tanto quanto temia a influência do carismático Rasputin junto da família imperial russa. Além disso, o pio e tacanho Nilus sofria dificuldades financeiras e culpava os judeus por isso.
Através da influência de Nilus, a Igreja Ortodoxa de Moscovo exigiu que os PSS passassem a ser lidos nas suas igrejas, como se se tratassem da continuação do Livro das Revelações/Apocalipse.
Os ultrareaccionários da «União da Nação Russa» que apoiavam a Dinastia Romanov, opondo-se à revolução, à instituição da Constituição e da Duma, necessitavam de angariar e unir simpatizantes da sua causa em torno de um inimigo fácil que, historicamente, deixasse um rasto de escândalos escabrosos que a maioria acreditava sem questionar a sua veracidade.
Os judeus encarnam na perfeição o papel de bodes expiatórios pelo menos desde que os gentios cristãos se afastaram, em fatal litigio, da ortodoxia judaica. Os últimos evangelhos canónicos a serem escritos reflectem bem essas divergências. Por ex., no Evangelho Segundo (ES) João, os escribas (talvez esquecendo-se de que o seu messias também era judeu…) colocam na boca de Cristo a afirmação de que os judeus são filhos do diabo e apenas fazem a vontade deste último na Terra. O ES Marcos mostra-nos uma versão de Cristo pouco pacifista, misericordiosa, tolerante e conciliatória, chegando ao ponto de ordenar aos seus seguidores para que trouxessem á sua presença os seus opositores (judeus) e que, ali mesmo, os matassem!...O Novo Testamento atribui aos judeus a principal responsabilidade pela crucificação de Cristo.~~~
~~ Aquele que é provavelmente o actor mais poderosos de Hollywood e um dos católicos (fundamentalista) mais famosos do mundo, Mel Gibson, defendeu-se das críticas de anti-semitismo evidentes no seu filme «A Paixão de Cristo», asseverando que apenas tentou reproduzir o que está escritos nos evangelhos canónicos, com a supervisão de especialistas independentes. Em 2006 o verniz estalou num escândalo esclarecedor… Um polícia de trânsito apanhou Mel Gibson embriagado enquanto conduzia um automóvel em via pública. Enquanto o oficial da Lei lhe pedia os documentos, a “mega estrela”, com arrogante azedume, perguntou-lhe «então mas você é judeu?! Os judeus foram os responsáveis por todas as guerras conhecidas!» Depois tentou intimidar o polícia dizendo que seria melhor não se meter com ele, pois era o dono de [quase] toda Malibú …
Desde o imperador (romano) Nero e por toda a Idade Média, cada vez que a Europa sofria graves crises (ex.: peste negra) os judeus eram sempre culpabilizados e perseguidos.
Pouco mais de um século antes de os PSS serem forjados, a revolta francesa contribuiu de sobremaneira para a divulgação de teorias da conspiração anti-semita consolidadas em prolixa literatura que se tornou muito popular no velho continente.
Em 1797 o jesuíta francês Abbe Barruel publicou um texto em que garante ter sido a Revolução Francesa obra de uma conspiração franco-maçónica. Em 1806 essa teoria foi adaptada a fim de que os “maus da fita” na destruição da monarquia passassem a ser os judeus.
Em 1882 a União Banqueira Católica enfrentava a bancarrota, deixando muitas famílias francesas de classe média sem o seu esforçado e vital pecúlio, enquanto que os bancos judeus prosperavam.
A facção de extrema direita da Okhrana utilizou os PSS com o objectivo principal de manipular o frouxo Nicolau II, instigando-o a se insurgir e tomar medidas musculadas/draconianas contra os que pretendiam uma mudança de regime, afastando igualmente alguns dos seus principais conselheiros que eram judeus. Vivia-se um período muito conturbado, estando prestes a rebentar a Revolução Bolchevique.
Em 1905 Nilus afirmou que os PSS eram fruto de um congresso sionista. Mas em 1906 George Butmi diz que, afinal, resultam de uma reunião maçónica…
A fósmea paranóica e xenófoba que foi construindo os PSS acabou por misturar judeus, com marxistas/comunistas e com franco-maçons, o que demonstra que a má fé dos que abraçavam essas teorias se baseava em pura ignorância. (ex.: nos séculos XVIII e XIX numerosas lojas maçónicas recusavam a admissão de judeus por estes não aceitarem Cristo como o seu Messias.)
O facto de Karl Marx ter identificado/reafirmado os judeus como símbolos da burguesia decadente, liderando o movimento capitalista global, contribuiu igualmente para a tragédia etnocida anunciada.
Entre 1919 e 1921 calcula-se que uns 60 mil judeus foram massacrados pelo Exército Branco, e os PSS foram uma das principais fontes ideológicas que inspiraram essa tragédia.
Nicolau II chegou a receber do seu Ministro do Interior, Piotr Stolypin, um relatório em que expunha a fraude dos PSS, o que deixou o Czar desapontado e Nilus numa posição muito precária junto da corte. Mesmo vendo o seu mundo desmoronar-se, Nicolau III teve a dignidade de se retractar em relação ao apoio entusiasta que inicialmente dera à divulgação dos PSS, chegando, em contrição, a afirmar que «não podemos defender causas puras com métodos sujos». Não obstante, tudo indica que Nicolau III continuou a servir-se dos PSS, para instilar o ódio como táctica contra-revolucionária, pois nessa altura chamou para junto de si Rachkovskii, dando-lhe carta branca para a divulgação do vil texto.
A revolução russa consuma-se em 1917. No ano seguinte toda a família imperial russa é executada sumariamente.
Os mais reaccionários apoiantes do regime czarista que conservaram dinheiro suficiente para procurar a continuidade de uma vida de privilégios noutras paragens, fugiram para ocidente, espalhando-se por toda a Europa e levando com eles o germe infeccioso dos PSS, que “atestavam” a sua odiosa convicção de que os judeus tinham arquitectado a revolução russa. (Creio que foi então que surgiu o mito de que os comunistas comem criancinhas, não passando de uma adaptação de outro absurdo calunioso que dizia que os judeus utilizavam um bebé cristão como o principal ingrediente da ágape ritualizada Matzah.)
Em 1919, Alfred Rosenberg, que era um dos principais propagandistas do Partido Nacional Socialista germânico, encarregou-se de divulgar amplamente os PSS. (Nos primeiros 2 anos em que foram publicados na Alemanha, os PSS tiveram 5 edições…) Para os alemães, este texto dava continuidade aos populares «Escritos Alemães», em que o seu autor, Paul Botticher, culpabilizava os judeus por todos os males desta civilização.
Mais tarde, Joseph Goebbels, o Ministro da Propaganda do governo de Hitler, serviu-se exaustivamente dos PSS, nomeadamente para produzir um pseudo documentário que se tornou o seu trabalho difamatório anti-semita mais conhecido, que se intitulava « O judeu Errante».
Em 1920, Lucien Wolf (do Concelho de Deputados Judeus) mobilizou todos os meios ao seu alcance para denunciar a falsidade dos PSS.
No ano seguinte, um correspondente do «The Times» em Constantinopla chamado Philip Graves, numa série de 3 artigos (publicados a 16,17 e 18 de Agosto), prova à Europa mais esclarecida e liberal que os PSS não passam de um plágio de uma obra satírica – que não contém referências especificamente anti-semitas – intitulada «Diálogos no Inferno entre Maquiavel e Montesquieu» (1884), cujo autor, um advogado parisiense chamado Maurice Joly, pretendia criticar, de forma mais ou menos velada, a política imperialista e despótica de Napoleão III. (O plano de acção concebido no inferno e defendido pela personagem que representa Maquiavel corresponde ao do líder de França à época.) A metáfora foi suficientemente clara para o imperador, e Joly foi mandado uns anitos para a cadeia.
Philip Graves deixou pouco espaço para dúvidas sobre a autoria dos PSS ser imputada a Rachkovskii, ao ter encontrado uma caixa de livros que pertencia ao referido oficial da Okhrana, onde estava o referido livro de Maurice Joly ao qual tinham sido arrancadas as primeiras páginas, começando a leitura (truncada) exactamente no ponto em que começa a ser plagiado para a elaboração dos PSS.
Antes da Okhrana plagiar e perverter a referida obra, o autor alemão Hermann Goedsche (que era secretário dos correios e espião da polícia secreta prussiana), sob o pseudónimo de Sir John Rectliffe, serviu-se igualmente dela para construir a sua série de novelas anti-semitas agremiadas sob o título «Biarritz» (1868), que relata uma hidra talmúdica (cujos lideres se reuniam, a cada 100 anos, no cemitério de Praga) que conspira para conquistar a dominância global, explorando e destruindo as outras etnias e culturas. No rescaldo da I Guerra Mundial, a profundamente humilhada Alemanha foi terreno fértil para estas absurdas teorias da conspiração que “incriminavam” os judeus, pois apresentavam uma explicação convenientemente simples e maniqueísta, com um demonizado inimigo culturalmente alóctone que era visto como a raiz do próprio mal; concomitantemente, desresponsabilizava todos os demais factores socio-económicos e oferecia um conforto psicológico aos alemães que preferiam aconchegar-se no papel de vítimas. Como agravante, os germânicos já tinham adoptado entusiasticamente o racismo académico de Gobineau, bem como a perversa e forçada interpretação da Teoria da Evolução de Darwin, a que chamavam “darwinismo social”. De recordar que, em 1879, no seguimento do popular livro de Wilhelm Marr intitulado «A Vitória do Judaísmo sobre o germanismo», criou-se a Liga Anti-semita…
Nos EUA, em 1935, Herman Bernstein também publicou uma elucidativa obra («A Verdade Sobre os PSS: a sua exposição integral»)em que desmascara os PSS, mas pouco pôde contra o clima de má fé anti-semita que estava mais propício a libar a peçonha ideológica de Henry Ford e de Adolf Hitler (o próprio Winston Churchil os defendeu, até que ficou provada a falsidade dos mesmos…).
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Ainda hoje este documento comprovadamente falso continua a disseminar a sua infecção ideológica anti-semita, sendo muito popular nos países árabes.
Na Rússia, só em 1993 é que um tribunal declarou «os Protocolos» como uma fraude, algo que estava provado desde a II Guerra mundial.
PB
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