Quem foi o pai da Igreja Católica? O apóstolo Pedro? O teólogo Paulo? Não, foi o Imperador Constantino.
O romano Constantino (que muito apreciava dar sermões sobre as virtudes do cristianismo e da sua pessoa aos membros do Senado, intimidando-os a seguir o seu exemplo, ou a enfrentarem os eternos suplícios do inferno…) declarou o cristianismo como a religião do Estado, consolidando a imposição de rígidas hierarquias em instituições político-religiosas que se apresentam como indispensáveis intermediárias entre Deus e os crentes – para melhor explorar e manter sob controlo os socialmente mais desfavorecidos.++
Mas vários séculos antes de Constantino já o Estado romano tentava andar de mãos dadas com a religião, fazendo do panteão de deuses um exército com capacidades de coerção e manipulação tão eficaz quanto os legionários na manutenção da “pax romana”.
Alguns exemplos de imperadores que seguiram essa estratégia:
- Júlio César afirmava-se com filho dos deuses Eneias e Vénus, e manteve a religião sob a rédea curta do Estado, chegando a auto proclamar-se Pontifex Maximus ;
- Augusto não teve o menor pudor em se promover como um deus ;
- Adriano foi ao cúmulo de completar o panteão romano com a deificação (por decreto imperial) de um seu amante morto por afogamento no rio Nilo! Nem Calígula se atreveu a ir tão longe, ao nomear o seu cavalo favorito (Inquitatus) como um sacerdote de pleno direito...
Assim, podemos concluir que Constantino, como líder do império, ao reformar a religião teve objectivos semelhantes aos de Josias (séc. VII a.C., Judá) com a implementação forçada do culto monoteísta a Jeová.
++ As prédicas de S. Paulo foram-lhe extremamente úteis nesses objectivos. (De um modo semelhante, a filosofia de Confúcio (5 séc. antes de Cristo) serviu o totalitarismo/despotismo das sucessivas dinastias chinesas, como doutrina de subordinação à autoridade (apesar de o primeiro imperador da China ter tentado erradicar o confucionismo). Confúcio defendia um respeito incondicional aos mais velhos e à unidade
familiar, como disciplina para o povo obedecer aos governantes. A família ideal para este filósofo-político tinha um forte cariz patriarcal (reservando
para as mulheres um estatuto idêntico aos dos servos) e todos deveriam honrar o soberano da nação, mesmo que se tratasse de um tirano. Era esta a forma
como Confúcio pretendia manter a ordem e a paz na sociedade.
Até o reformador cristão Calvino (1509 - 1564), um dos maiores ideólogos protestantes, durante muitos anos defendeu a ideia de que a obediência às
autoridades civis era um dever cristão. Só quando sentiu que essas autoridades ameaçavam a sua vida e a dos seus irmãos de fé devido à intolerância religiosa, é que mudou o discurso apelando à desobediência civil, argumentando que as autoridades (a monarquia, neste caso) que perseguem a religião que Calvino considerava a verdadeira, perdem o direito a ser obedecidas.
Na qualidade de verdadeiro pai da Igreja Católica Apostólica Romana, Constantino dotou o cristianismo de uma ideologia política imperialista. O crescimento desse culto foi conseguido pelo favorecimento (em detrimento das outras religiões) através do mecenato imperial e de legislação que fez aprovar especificamente para esse propósito; subornou e recompensou com postos na hierarquia imperial os neófitos mais ambiciosos e oportunistas; e a sua obsessão pela ostentação de poder e de riquezas, levou-o a mandar construir numerosas igrejas decoradas com pedras preciosas e outros luxos deslumbrantes. Assim, a popularidade do seu cristianismo cresceu (proporcionalmente ao esvaziar das virtudes que esse culto já possuíra quando os seus devotos tentavam agir de forma coerente com as principais mensagens e qualidades de Jesus Cristo) até acabar por se tornar a religião unificadora do império e a principal garantia de estabilidade política de Constantino. Por esse motivo, os imperadores que se lhe seguiram viram-se forçados a continuar a defender o cristianismo, ou melhor, a política dinástica cristã.
Constantino era um homem tão patologicamente agarrado ao poder que, entre as muitas atrocidades que cometeu para o conservar, foi o responsável pelo desencadear de uma guerra civil desnecessária e nem a sua própria família escapou às suas vingativas e paranóicas suspeitas de conspirações e de infidelidades, tendo mandado assassinar a sua cunhada, a sua esposa e o seu filho mais velho.
Como naquele tempo ainda não estava instituído o ritual expiatório da confissão, Constantino esperou até sentir que estava às portas da morte para se fazer baptizar, acreditando que tal abluiria todos os seus pecados, enviando-o directamente para o reino de deus puro como
um anjo.
O terceiro Concílio de Latrão (realizado em 1179) consolida a política de unificação da Igreja com o Estado iniciada com/por Constantino e Teodósio (este último tornara a Igreja Católica como a religião oficial do império, ao ponto de conversão passar a ser obrigatória). No seu cânone 27 aponta a obrigação dos príncipes em ajudar a Igreja a reprimir a heresia (assim como a Igreja ajudava a legitimar o poder – “concedido por Deus” – dos monarcas). Os senhores da guerra acudiram ao apelo, fornecendo os meios para assegurara protecção dos clérigos bem como para implementar as decisões eclesiásticas, por mais impopulares que fossem. A partir daí, o crime contra a fé foi oficialmente considerado crime contra o Estado.
PB
Sem comentários:
Enviar um comentário