sexta-feira, março 02, 2007

Pouco importa a quantidade de informações acumuladas, sem a capacidade de formular, discutir e ensaiar novas ideias. Esta asserção é tão válida para os indivíduos como para as civilizações em ascensão.


“Entramos na cadeia de produção aos cinco anos, por vezes antes. Separam-nos por idades, em grupos manejáveis. (…) Não podemos seguir o velho modelo de educação industrial: eficiência, controlo, coação. O sistema é uma máquina que se tornou obsoleta.” – Carlos Fresneda (2002)



a UNESCO aponta Portugal como não investindo mais que 5% do PIB na educação (instrução), o que é próximo da média europeia, mas fica muito aquém da Suécia e da Dinamarca. Na Europa dos 25, apenas malta fica abaixo do nosso país no que toca à percentagem de jovens que completa o ensino secundário. Com a facilidade de trânsito que irão usufruir as populações (em média com maiores qualificações e desejosos de emigrar e/ou de acolher fábricas à procura de mão de obra barata) dos novos países aderentes (à U E), a disputa por empregos irá agravar as tensões sociais.
90% do orçamento para a educação/instrução é gasto nos ordenados dos professores, sendo principalmente as famílias dos estudantes (através das propinas) que têm arcado com o grosso das despesas de manutenção das universidades (Cabrito, 2004).



O governo exige que os departamentos de investigação das universidades se auto-financiem, o que se traduzirá na total dependência de apoios externos, nomeadamente de empresas. E assim se estrangula a pouca investigação independente de que beneficiávamos. Mas tal não é nenhuma surpresa, pos há muito que grande parte dos estudos efectuados pelas universidades são estudos de mercado destinados a permitir mais penetrações na vulnerabilidade consumista dos crédulos e eternamente insatisfeitos cidadãos.
(Como uma solução de compromisso pontual, os novos laboratórios da Universidade de Coimbra são patrocinados por uma instituição bancária.)
O Dr. Jorge Paiva é provavelmente o nosso maior botânico no activo. Mas é muito mais do que um investigador e catedrático (cujo trabalho é reconhecido internacionalmente), e um livro que aborde a educação ambiental em Portugal não poderá deixar de falar sobre ele .
É já lendária a sua entrega e capacidade de trabalho, e não há ninguém que tenha sido seu aluno que não o admire profundamente.
Manteve-se sempre fiel aos seus ideais ambientalistas com uma integridade e dignidade como quase não se vê em lado nenhum. Emprestou, de forma totalmente abnegada, os seus conhecimentos e o seu prestígio a várias ONGAs e campanhas, mas nunca lhe interessou o protagonismo mediático e sempre conseguiu esquivar-se às manipulações que o queriam submeter o poder político. Com lucidez e coragem, tem enfrentado quaisquer poderes instituídos, tendo sofrido vários atentados à sua vida quando (na década de 80) se empenhou em denunciar os interesses das celuloses e dos medeireiros.
No final dos anos 90, reformou-se do ensino para poder dedicar-se mais à investigação (no Instituto Botânico de Coimbra) e para atender a imperativos de consciência que o impelem para uma maratona de visitas a quase todas as escolas do país, tentando disseminar poderosas mensagens ambientalistas. Durante esse périplo (que ainda não findou) nunca recebeu quaisquer apoios. Até o combustível do seu automóvel (um modelo caro que se viu obrigado a comprar com o principal fito de aguentar tanta estrada) e as refeições teve que pagar do seu bolso. Prescinde ainda de receber honorários das suas acções de formação de professores promovidos pelas ONGAs e é a pessoa que mais tem investido na sensibilização ambiental dos nossos juízes.
O seu empenho como activista da ecologia é tanto mais admirável quando percebemos que o faz sem sequer nutrir esperanças de que a actual crise ambiental e social mude para melhor, e nunca perdendo o sentido de humor.
A sua actividade tem-no levado aos pontos mais remotos do globo, de onde traz sempre, a par de volumosos herbários, uma mancheia de estórias do mais fascinantes e divertidas que se possa imaginar.
É ainda colaborador de vários institutos botânicos estrangeiros, da Flora Ibérica, participando dos inventários taxonómicos de tantas outras floras por todo o mundo (ex.: Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Malawi, Zimbabué, Timor Leste, Brasil, …).
Para mim tem representado o melhor de Portugal com um mérito inspirador só comparável ao trabalho de medicina humanitária protagonizado pela AMI (Assistência Médica Internacional, presidida pelo Dr. Fernando Nobre), que quase me restituem a fé na humanidade. Bem hajam.
Peço que o Dr. Paiva me perdoe a inconfidência, mas sinto-me na obrigação de aqui transcrever um pequeno excerto de uma das suas cartas a mim dirigidas, para que tenham consciência do tipo de consideração que o governo e as universidades reservam aos idealistas mais competentes.
« (…) Já dormi muitíssimas vezes ao relento por não ter dinheiro para uma pensão sequer. Ainda o ano passado [2003] o fiz em Timor e fi-lo muitas vezes na Plaza Mayor de Madrid, quando lá vou trabalhar para a Flora Ibérica, pois Portugal está de tanga e nunca me deram dinheiro para cobrir as minhas despesas inerentes a esse trabalho, quanto mais para os trabalhos ambientais. É o país que temos. Nas viagens que faço para a colheita de plantas nos trópicos (…) pagam-me apenas as viagens.»




As marcas e a escola
No que toca às influências culturais externas, cá vamos cumprindo o nosso triste fado de sermos espelhos (distorcidos) do que pior se passa por terras do “tio Sam”. Estou curioso para ver quanto tempo demorará até termos as escolas patrocinadas por marcas, ou se, por outro lado, os educadores portugueses saberão marcar uma fronteira de decência e dignidade, recusando-se a debicar as migalhas na mega liça comercial.
O fantasma do deficite patrocina/apoia/impulsiona as privatizações e o proxenetismo. Os Estados concedem benesses fiscais e outras regalias aos “tubarões” da economia (que esfregam as mãos de contentes ante as recessões por eles criadas, enchendo os bolsos à custa da miséria alheia e, ainda por cima, sendo aclamados pelos seus “milagres económicos” baseados na absoluta precariedade do sector dos serviços), enquanto que reduz os gastos do erário público em sectores fundamentais como a educação, a saúde e o ambiente. Mas não há político que se abstenha de alardear sobre a imprescindibilidade de equipar as escolas com programas de softwar educativo. E as associações de pais concordam entusiasmadas. E o espaço virtual da Internet vai ganhando uma preponderância maior do que as salas de aulas. E a pedagogia de carregar botões vai-se afirmando como um fim em si, tornado obsoletos/anacrónicos os restantes auxiliares pedagógicos, apesar de muitos renomados pedagogos questionarem os seus exacerbadamente propalados benefícios (ainda por comprovar)


As crianças ainda mal sabem falar e já os pais insistem em medir-lhes a inteligência pela habilidade que eventualmente tenham em reconhecer caracteres e em manipularem um teclado de computador.
Foi essa obsessão pela tecnologia de ponta que abriu as portas das escolas e estendeu uma passadeira vermelha às marcas, permitindo que estas tomassem de assalto tão cobiçado bastião – fervilhante de consumidores ávidos e ingénuos.
Como muitas escolas (mesmo desviando verbas anteriormente atribuídas à educação , ao teatro, à literatura e até ao desporto, ente outros exemplos) carecem de fundos de maneio necessários à aquisição de uma parafernália de áudio visuais, cederam ao assédio chantagista das corporações. Estas últimas fornecem-lhes os brinquedos caros, e em troca as escolas têm que prestar vassalagem às suas marcas. E não lhes chega estarem presentes em cartazes, nos autocarros, nos equipamentos desportivos, na cantina, etc…; exigindo entronizar os próprios programas educativos. Assim, aos alunos é-lhes pedido que utilizem todos os seus conhecimentos multidisciplinares para que concebam campanhas publicitárias e pesquisas de mercado tendo como figura central uma determinada marca. Esses alunos poderão (ou não) receber vários brindes adicionais (às notas académicas) e até a possibilidade de estagiarem nessas empresas.
Um dos casos que no final dos anos (19)90 fez correr mais tinta pelo seu carácter anedótico e ao mesmo tempo extremamente perturbador, foi o de um finalista da Escola Secundária de Greenbriar (Geórgia, E.U.A.) chamado Mike Cameron. Ora este adolescente foi suspenso pelo concelho directivo por ter cometido o infame atrevimento de vestir uma T-shirt com o logótipo da Pepsi no dia em que o seu liceu declarou como “Dia Oficial da Coca-Cola”!...
Mas as instituições públicas (ex.: escolas, câmaras municipais, …), pelas avultadas verbas que desembolsam podem e devem ter uma atitude de integridade musculada exigindo às empresas fornecedoras de bens e de serviços um mínimo de moralidade na sua conduta. A ética empresarial (sob vigilância independente) terá que começar a fazer parte dos contratos de trabalho.



Um ambiente “pedagógico” uniformizante , opressivo e contra natura, será sempre um terreno demasiado árido para medrarem valores mais democráticos, mais conscienciosos, mais respeitosos, mais solidários e mais felizes, que sejam os pilares de um novo humanismo ecológico. «Uma nova política de educação/instrução teria que dar prioridade à formação de uma geração de cidadãos possuindo as competências e as qualificações que as novas lógicas requerem: as da economia social, da economia solidária, da economia local, da economia cooperativa. Daria igualmente uma importância primordial à cooperação com outras comunidades, regiões e povos do mundo, no sentido de fazer recuar a actual tendência para a apropriação privada dos conhecimentos, colocando estes últimos ao serviço da promoção de um estado de bem-estar mundial que garantisse a todos o direito a uma vida digna» (Ricardo Petrella, Le Monde Diplomatique 2001)
Ao invés de os laboratórios bioinformáticos da procreática brincarem com as hélices duplas do ADN, como se estas fossem serpentinas de carnaval que alguns desejam comercializar na feira das vaidades, se queremos melhorar como indivíduos e como espécie, teremos que parar de destruir o meio ambiente e recuperar habitats; adoptar hábitos saudáveis; investir numa correcta educação e miscigenarmo-nos.


Um crescente número de pais tem vindo a discutir os postulados morais e éticos de entregar ao Estado a educação dos seus/nossos filhos, sentindo que, se não reivindicarem um papel mais activo e responsável, correm o sério risco de se tornarem meros proprietários absentistas dos seus descendentes. Como poderão desfrutar e conhecer bem as crianças entregando-as – logo a partir dos três meses! – a terceiros para que cuidem deles, mal os vendo nas sobras dos seus dias apressadamente desventurados. Se é verdade que uma nação de crianças subnutridas e carentes de educação vão construir sociedades necessariamente débeis, parece-me igualmente óbvio que as crianças que crescem num estado de semi-abandono por parte dos seus pais entregues a um mundo materialista e competitivo, não poderão tornar-se adultos equilibrados e felizes. Esse estado de orfandade afectiva (que os técnicos denominam de “défice parental”) poderá dar uma nova relevância ao papel dos avós, mas por mais disponíveis e carinhosos que estes sejam, não podem substituir o papel dos pais e dificilmente conseguem colmatar esse “síndroma do ninho vazio” (quando os pais estão fora todo o dia).

A opção pelo ensino doméstico (homeschooling) parece excessivamente contra-a-corrente para alguns pais “tresmalhados” e com demasiadas preocupações económicas poderem levar a cabo. Indubitavelmente, este é um sistema alternativo que necessita estar ligado a uma rede de apoio bem estruturada e competente. Não se pretende um isolamento pristino/imaculado das crianças, apenas se considera que deverão estar adunadas por reais interesses num ambiente não competitivo, não por uma fatalidade comum e aleatória. Estimular a criatividade e os valores solidários e ecológicos tampouco significa excluir do programa de ensino tudo o que se relacione com as disciplinas formais do currículo académico.
Provavelmente o melhor sistema de ensino doméstico que tive conhecimento (aqui no ocidente) é/foi o afecto à pedagogia Montessori.

Waldorf
A pedagogia Waldorf parece-me mais interessante pela metodologia prática+++++ do que pelos fundamentos teóricos (doutrinas algo esotéricas e cristocêntricas, onde abundam estorietas bíblicas e mitos nórdicos). Mas o que realmente me constrange e entristece é o facto de os escassos exemplos que conheço em Portugal (tanto as escolas já em funcionamento, como diversas tentativas para a implantação das mesmas que eu tenho tido a oportunidade de acompanhar) estarem pouco abertos às crianças portuguesas, sendo um privilégio (discriminatório) quase exclusivo de cidadãos de origem germânica, algo relutantes em se integrarem na nossa cultura.
Felizmente, para salvaguarda do que há de melhor na referida filosofia pedagógica, na Casa de Santa Isabel (em S. Romão, no sopé da Serra da Estrela) existe uma comunidade terapêutica (orientada pelos princípios de Rudolf Steiner~~~~~~~~~~~~) vocacionada sobretudo para crianças deficientes, que bem merece uma visita e o nosso apoio.

+++++trata-se de um sistema não competitivo que prescinde de exames regulares, pois as crianças são (se tudo correr bem) acompanhadas pelo mesmo professor ao longo dos anos. Como tal o conhecimento mútuo é suficiente. As crianças são reunidas em pequenos grupos num ambiente familiar. Nos primeiros anos, são elas que vão elaborando os seus próprios livros de estudo, como registo das experiências de aprendizagem mais marcantes, e também é-lhes dada a liberdade para escolher os temas sobre os quais irão desenvolver as actividades criativas e de investigação. Aliás, a componente prática e artística(ex.: trabalhos manuais, música, pintura, dança, ginástica,…) jogam um papel preponderante.com frequência celebram festivais sazonais.
línguas estrangeiras fazem parte do currículo logo desde o início. ~

~~~~~~~~~~~Rudolf Steiner foi um notório filósofo austríaco ( inventor da antroposofia), igualmente bem sucedido como cientistas (apologista da ciência-espiritual), pedagogo, escritor e pai da agricultura biodinâmica. É precisamente na Áustria que encontramos a maior concentração europeia de agricultores (certificados) afectos à agricultura biológica.

Nos estados Unidos brotam (e florescem!) alguns exemplos interessantíssimos que merecem a nossa atenção. Comecemos pelas “charter schools”. Tratam-se de projectos concebidos e levados a cabo pela acção conjunta de professores, pais e alunos. Estes pedem ao Estado a concessão temporária de uma escola para aí desenvolverem os seus projectos educativos alternativos. Havendo concordância de ambas as partes, as autoridades estatais outorgam-se o direito de avaliar (com uma periodicidade de 3 ou 5 anos) o sucesso destas iniciativas.
As escolas livres (free schools, no original) são de cariz libertário e, nesse país, abarcam já mais de três mil centros educativos.
Ensino doméstico (Home schooling) mais de um milhão e meio de jovens (não escolarizados, mas perfeitamente legais) estão afectos a este sistema. Os seus resultados, em termos de aquisição de conhecimentos teóricos e práticos, têm surpreendido pela positiva até os seus detractores mais ferozes. O que é mais importante é que estes jovens mostram-se mais realizados, mais felizes e mais maduros que o maralhal perdido no ensino formal.
Pais/educadores ligados pela net
Web sites úteis:
www.paideiaescuelalibre.org
www.newhorizons.org
www.rethinkingschools.org
www.selfeducation.org
www.great-ideias.org/paths.htm
www.schumachercollege.org
www.eduscol.education.fr/



centro Fernano Bernaldez Gonzalez
Ceneam

(Mas atenção que os cabos de fibra óptica não podem substituir o calor
humano; as informações que melhor se assimilam são aquelas partilhadas
pessoalmente.)
Centros de aprendizagem
Juntas escolares – inclusive algumas escolas públicas (convencionais) permitem que essas crianças se matriculem apenas em algumas disciplinas que elas e os seus pais julguem convenientes
Grupos desportivos e artísticos; actividades ar livre, intercâmbios com outras famílias,…


Respondendo a uma das perguntas que mais aflige os pais indecisos por seguir estas vias alternativas de ensino, devo deixar claro que os jovens que decidem completar os seus estudos ingressando no ensino formal costumam passar os testes de admissão com distinção.

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