sexta-feira, julho 28, 2006

No decorrer das minhas actividades de educação ambiental ligadas a uma ONG, tive que elaborar o seguinte texto há cerca de 7 anos. Ainda não o actualizei, mas alguns dos avisos que então fazia, para desgraça de todos, acabaram por se cumprir… Além de que a situação (devido à pouição, ao aumento da temperatura global e aos consequentes incêndios) não fez mais do que se agravar exponencialmente.
Se conseguirem dominar estas informações sobre a floresta que tenho vindo a divulgar neste blog, ficam a saber mais sobre a nossa floresta do que a maioria dos engenheiros florestais formados em Portugal – aparentemente com o único objectivo de aprenderem a fazer as odiosas monoculturas que estão a dar cabo do país... A maioria deles nem sequer se molesta em aprender a distinguir as nossas árvores autóctones!…




História da desflorestação no Mediterrâneo
Depois das glaciações, Portugal foi coberto por “florestas mistas (Fagosilva) com árvores sempreverdes e caducifólias, transformando o país, praticamente, num imenso carvalhal, caducifólio a Norte do Tejo e perenifólio para Sul. « Por destruição dessas florestas, as nossas montanhas passaram a estar predominantemente cobertas por matos de giestas, por tojos, urzes (torgas) e carqueja. A partir do século passado, foram artificialmente rearborizadas com pinheiro-bravo (Pinus pinaster), o que as transformou num imenso pinhal. Com os incêndios e devido a outras acções negativas do homem, parte dessas montanhas e algumas zonas ribatejanas e alentejanas, estão já transformadas em imensos eucaliptais e acaciais , meio caminho andado para se tornarem em zonas desérticas, tal como já se podem observar nalgumas montanhas do Norte e Centro de Portugal.» - Jorge Paiva (1998)
«Os desbastes, o fogo e a pastorícia estão na origem da muito acentuada regressão dos carvalhais que presentemente se acham representados apenas por resíduos de área diminuta e floristicamente pobres. Também a introdução de espécies exóticas pelos Serviços Florestais contribuiu para a sua fraca representação actual» -Silva, A. Pinto & Teles, A. N.(1986)

As estimativas referentes à taxa de destruição varia consideravelmente de autor para autor. Por isso decido reportar-me aos números que reúnem um maior consenso entre a comunidade científica.
Se o ritmo da desflorestação voltar ao verificado entre 1984 e 1994 – quando demos por perdidas metade das florestas tropicais - não restará nenhuma esperança para a manutenção dos bosques.a FAO (Organização para a Alimentação e para a Agricultura),Recorrendo a análise de dados obtidos por satélite e por numerosos técnicos no terreno, calculou que só em 1990 foram destruídos 40 milhões de acres, o que equivale, de grosso modo, a um acre por segundo



Em cada minuto que passa é destruída uma área de floresta virgem equivalente a 37 campos de futebol. (É claro que se fossem realmente campos de futebol a maioria de nós não ficaria indiferente a esta tragédia...).Se incluirmos neste inventário tétrico áreas ocupadas por vegetação semi-natural (ou sejam, que sofreram modificações pela mão do homem, e isso inclui todas as zonas verdes europeias) o nível de destruição aumenta (diariamente) para 60 hectares por minuto, colocando em perigo de extinção uma em cada dezena de espécies superiores.
Tendo em consideração que um hectare de floresta tropical húmida contém mais biodiversidade (realmente inimaginável para as nossas latitudes) do que todas as florestas temperadas juntas! Por exemplo, num só hectare de selva amazónica foram encontradas400 espécies de árvores. Uma única árvore pode albergar 1200 espécies decoleópteros (escaravelhos). A maioria destes seres permanece desconhecida para a ciência. Nem 2% das espécies de árvores da referida selva estão minimamente estudadas pelo comunidade científica

Segundo a associação ambientalista World Wide Fund for Nature (WWF) e a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), 8753 espécies de árvores no mundo – dez por cento do total – estão à beira da extinção! Ao todo, são 25 mil as espécies de plantas que se calculam estarem na mesma situação fatídica!
Actualmente Portugal é o país da União Europeia que apresenta uma maior taxa de avanço do deserto (físico e humano), com 66% das suas terras consideradas de baixa qualidade.
«Houve um tempo em que ser um povo mediterrânico era quase uma garantia de ser um povo dominador, pois as terras eram extraordinariamente ricas e o clima ideal. Mas os homens do Mediterrâneo, explorando irracionalmente os seus não demasiadamente largos recursos, laboraram, ao destruir a natureza, a sua própria decadência.» (Enciclopédia “A Fauna”, 1978) Hoje quase nada resta do primevo dossel florestal nem da fertilidade mítica das suas terras.

O dramático processo de desflorestação é o resultado de uma intervenção sistemática e plurissecular do homem no meio ambiente, visando a dominação da natureza. «Mas a destruição dos ecossistemas florestais em tempos pré-históricos era lenta, e não devastadora, como é presentemente, com a moderna tecnologia. Assim, a floresta “recuperava”, embora, muitas vezes, com competição diferente, mesmo quando o homem utilizava o fogo como auxiliar na conquista das áreas desflorestadas. O incêndio, de origem espontânea ou não, ocorrido na Serra da Estrela há cerca de 4300 anos, destruiu, praticamente toda a sua vegetação. A floresta, no entanto, conquistou de novo a montanha com um povoamento dominado pelo vidoeiro (Betula alba L. var. alba), apesar de já nessa altura o homem exercer ali a pastorícia.» - Jorge Paiva (1996)

Resumidamente passaremos a referir os marcos mais importantes na história da desflorestação do nosso país, que ter-se-á iniciado no Neolítico (à cerca de 7500-8000, no Médio Oriente ou no subcontinente indiano, mas que chegou tardio a Portugal, uns 3000 anos depois) com o advento da agricultura (cereais trigo e cevada) a domesticação de animais (cabra e ovelha). E a fagosilva começou a sucumbir ao avanço inexorável do “progresso”...
A madeira era virtualmente o único combustível da antiguidade (e ainda o é actualmente para metade da população mundial) e um dos principais materiais de construção.
Para os romanos a península ibérica era uma fonte muito importante de madeiras, tendo este povo desflorestado a nossa península tanto quanto pode. Mais até do que a construção, era a fundição de metais que exigia enormes quantidades de madeira. Dentro do império romano, Só as florestas particularmente inacessíveis se salvaram . Para além da Península Ibérica, o Chipre e as Balcãs foram intensamente desflorestadas literalmente em nome do “vil metal”.
Em relação às sua províncias do Norte de África, no início da era Cristã, tinham-se tornado no celeiro de Roma, intensamente agricultadas com cereais, olivais, vinhas e pecuária.
Faustosas cidades floresceram nessas colónias mais meridionais do império romano, à conta de um lucrativo comércio de exportação. O fluxo de barcos para abastecimento alimentar de Roma era constante, pois esta demandava quase 500 mil toneladas anuais (150 mil das quais destinavam-se a alimentar o exército romano) de cereais.
Chegaram ao cúmulo de proibirem o plantio de árvores na África mediterrânica sob o seu domínio, para que não competissem com as extensas searas. E os solos, que antes se contavam entre os mais férteis do império, não tardaram a exaurir-se, nunca mais se recuperando, antes pelo contrário.
O Sahara, tal como o conhecemos hoje, tem pouco mais do que 2 mil anos. As últimas descobertas científicas, embora não ilibem a acção humana, falam de uma ligeira alteração na órbita terrestre, ocorrida há uns 5 mil anos, capaz de alterar drasticamente o clima naquela região africana. Acontece ciclicamente a cada 20 mil anos, e é actualmente considerado como o mais preponderante fenómeno natural na alternância entre a aridez mais extrema e a humidade vicejante no Sahara.


*-+ Curiosamente, o império romano floresceu (de 600 ªC. a 200 d.C.) numa época em que o clima foi especialmente quente, tendo o seu colapso correspondido a um dramático arrefecimento da Europa...

A Norte do Reno e do Danúbio ainda havia extensas áreas de florestas pristinas. E nos dois séculos após os romanos deixarem de dominar o mundo conhecido, até as florestas ibéricas puderam recuperar parte do seu esplendor original.
E mesmo vários século antes do império romano se ter consolidado, já os gregos contribuíram de sobremaneira para a desflorestação dos seus domínios. Platão, nos seus escritos de Critias, salienta que “o solo foi arrastado para o fundo do mar. as altas e terrosas montanhas, que no passado sustentavam viçosos bosques e grandes pastos, transformaram-se em terrenos rochosos e assemelham-se aos ossos de um corpo enfermo...No passado, a água da chuva era útil e não escorria impetuosamente sobre a terra estéril em direcção ao mar, como sucede agora. Infiltrava-se, ficava armazenada na terra e repartia-se entre as culturas agrícolas, as fontes e os rios.” Eis um lamento bastante lúcido e esclarecedor do processo erosivo.
O historiador grego Heródoto, cinco séculos antes de Cristo, tendo observado a acção dos seus patrícios no norte de África, concluindo que: “o homem atravessa a paisagem, e o deserto segue as suas pisadas.” (Aliás, a franja norte do deserto do Sahara, tal como o conhecemos hoje, tem apenas 2000 anos. Aí corriam grandes rios cheios de hipopótamos e de crocodilos. Mas há 80 mil anos este deserto ocupava uma área muito mais vasta do que a actual. E terá sido esse terrível período de seca que empurrou os nossos antepassados a sair de África)
Os árabes, mais conscientes dos problemas relacionados com a erosão (talvez por as suas origens estarem ligadas a paisagens áridas e considerarem a Península Ibérica como o seu paraíso terreno), souberam valorizar os solos e a vegetação que os sustentava, desenvolvendo um sistema agrícola baseado nos socalcos para os terrenos declivosos, assim como em sofisticados e eficientes sistemas de rega e de armazenamento de água. Tendo-se tornado grandes especialistas em irrigação e em práticas agrícolas pouco agressivas, os seguidores de Maomé, a partir do séc. VIII, tornaram a Península Ibérica um dos sítios mais aprazíveis para se viver em todo o mundo.
Tanto os cristãos como os muçulmanos acreditam numa vida melhor para além da realidade terrena e mundana que conhecemos. Mas, ao contrário dos cristãos, os seguidores de Maomé procuraram construir um paraíso na Terra (e não apenas para as elites), onde pudessem desenvolver o que julgavam ser as maiores qualidades humanas (com destaque para a música e para as ciências) em paz, harmonia social e na prosperidade económica baseada no domínio da agricultura, da indústria e no comércio internacional. Para um povo que tinha vindo do deserto engajado numa jihad de intolerância sanguinária, ambicionando conquistar um império de lamas para Alá, e, para si, uma vastidão de recursos naturais muito mais ricos do que aqueles que tinham na sua terra natal, a Península Ibérica, e em especial a Andaluzia, tornou-se o seu paraíso terreno que amavam e cuidavam profundamente. Ainda hoje os árabes se referem à Andaluzia como «o paraíso perdido». E é fácil de ver porquê: essa região continua conhecida como a possuidora da mais elevada biodiversidade da Europa, contando com uma espantosa variedade de biótopos/ecossistemas e com mais de 80 espaços protegidos para a conservação da natureza.
No final do século X, estabeleceu-se um califado em Córdoba, que, em muitos aspectos, foi o percursor do movimento renascentista que séculos mais tarde nasceria em Florença, Itália. No período áureo da Espanha Mourisca (que terminou no séc. XIV, verificando-se então uma acentuada decadência da cultura ibero-árabe, culminando na perseguição, exploração e, finalmente, expulsão dos árabes no séc. XVII), conseguiram recuperar o melhor da cultura clássica grega, romana e persa. Os mais brilhantes engenheiros, agricultores, arquitectos, matemáticos, astrónomos e músicos árabes fizeram obras maravilhosas no Sul de Espanha – onde nas suas cidades cosmopolitas se verificava uma inusitada coexistência pacífica e produtiva de diversas “raças”, credos e culturas foi a base para tal prosperidade. (De forma quase ignominiosa, o nosso meio académico tem desprezad a preponderante contribuição que os conhecimentos árabes tiveram no desenvolvimento das artes de marinhagem portuguesas aquando da Época dos descobrimentos.)
No mesmo ano em que Colombo “descobre” a América, a sua soberana, Isabel de Castela, conquistou o último bastião muçulmano em solo ibérico - a belíssima cidade de Alhambra. Isabel era uma monarca cuja força e determinação só eram comparáveis ao seu fervor religioso. Para ela, a luta contra os “mouros” era tanto uma cruzada de cariz religioso , como um degrau essencial na sua estratégia de unificar todo o país, de modo a que o seu poder não fosse questionado por todos os senhores da guerra (católicos) que dominavam os vários reinos que constituíam o que actualmente conhecemos como a Espanha.
Em Alhambra defrontou um monarca muçulmano demasiado frouxo e sem habilidades guerreiras suficientes para estar à altura tarefa (com um enorme peso histórico) que a sua comunidade dele exigia, tendo capitulado e negociado a sua rendição (o que provocou a irada indignação até da sua mãe que o chamou de traidor efeminado...), após enfrentar um cerco do exército católico. Ao entregar o derradeiro reino muçulmano aos seus inimigos, terá concluído ser essa «a vontade de Alá» (sic) (palavras que continuam a provocar azia aos poucos jihadistas que conhecem este episódio e que o sonegam nas suas doutrinações terroristas).
Mas a rainha Isabel acabou rendida aos encantos de Alhambra – cidade onde quis ser enterrada -, deixando quase intacto (para além da adição inevitável aos edifícios de símbolos cristãos) o seu rico legado árabe (chegou a assinar um documento em que exigia que os seus descendentes fizessem o mesmo). De forma inédita na conturbada história destas culturas, na referida cidade, cristãos e muçulmanos concordaram em formar um governo misto que assegurasse uma transição pacífica e profícua das respectivas administrações, zelando pelas necessidades de ambas as comunidades – que durante umas décadas conseguiram coexistir exemplarmente (mesmo tratando-se de uma situação de conquistadores e de subjugados).
Aproveitando um período de paz que se instalou em todo o seu reino, Isabel e o seu marido, Fernando, souberam deixar que os castelhanos usufruíssem das vantagens que advinham do contacto com uma cultura em tudo superior à sua. Os judeus também faziam parte dessa diversidade cultural. Tal como tinha acontecido quando os romanos conquistaram os gregos, também na Andaluzia os árabes foram importantíssimos na educação dos seus novos amos.
Esta original coexistência foi destruída no reinado de Carlos V (sobrinho neto de Isabel). Apesar de Ter sido criado na Flandres, Carlos V fora educado por sábios muçulmanos que certamente amiúde lhe falavam das maravilhas andaluzas. Mal chegou ao poder, fez de Granada (que se encontra geminada com Alhambra) a capital do seu reino. Carlos V parece que pretendia seguir as directrizes da sua tia-avó no que respeita à política de tolerância, mas, com a Inquisição à perna, exigiu que os muçulmanos andaluzes se convertessem ao cristianismo. Estes resistiram e, em retaliação, foram expulsos de volta para África. A obtusidade fanática e violenta dos cristãos fez com que cultura ibérica regredisse vários séculos, estagnando numa idade de trevas.

Agora que o mundo muçulmano não está a atravessara sua melhor fase, muitos líderes religiosos jihadistas acreditam que a sua cultura
perdeu o império que possuia nos séculos XV e XVI porque « se desviaram do bom caminho traçado pelo profeta Maomé.»
O ataque de Madrid perpetrado pela al-Qaeda (a 11 de Março de 2004) não se deveu apenas ao facto de o governo de Áznar Ter apoiado a invasão do Iraque e para lá Ter enviado tropas. Os jihadistas ainda nutrem o velho ressentimento de terem perdido o saudoso al-Andaluz.







Segundo José Vieira (1991), numa era mais recente, antes do início da nossa nacionalidade (séc. XII), a consequente sucessão de invasões e guerras que se geraram desde os Celtas (séc. VI a.C.), os Romanos (séc. III a.C.), os povos bárbaros – Alanos, Suevos, Vândalos e Visigodos – (séc. V) e os Árabes (séc. VIII) marcaram profundamente a regressão do coberto vegetal. O Reino de Portugal deu continuidade, de forma exacerbada, a esta “tradição” de violência e destruição, sendo frequentes as lutas de reconquista do território aos árabes pelos cristãos, e contra os espanhóis.
«O Reino de Portugal não foi em sua guerreira infância senão um vasto campo de batalha onde, por entre incêndios e ruínas, as famílias vagueavam buscando o amparo dos muros fortificados, e só à medida que as fronteiras árabes recuavam e se encurtavam, e os distritos começavam a respirar, é que nas brenhas , couto dos ursos e javalis, nos ermos onde preavam os lobos e nos serros visitados das águias, a civilização, ainda rude e tímida, tenteava os primeiros passos, rompendo a rudeza alpestre.» - Rebelo da Silva (1868)

Uma carta régia do séc. XV dá-nos conta da tentativa de implementação de medidas proteccionistas por forma a refrear a desflorestação em Portugal. Este documento foi secundado pela Lei das Árvores (1565) destinada a rearborizar os baldios e as propriedades privadas. Apesar de as fagáceas********* estarem teoricamente contempladas, os pinheiros, pela sua rusticidade, foram as árvores eleitas nesta intervenção. O modelo e a política foram continuados e acentuados pelo Estado Novo. Assim, sob mando de Salazar, as serrar do centro e norte do país converteram-se na maior mancha de pinhal contínuo da Europa.

Fagáceas
Os carvalhos (incluindo os sobreiros e as azinheiras), os castanheiro e as faias(estas últimas não ocorrem naturalmente em Portugal, mas em Espanha)pertencem à família das fagáceas, que se distribui por uma vasta área doglobo terrestre, sobretudo nas regiões temperadas. Vários botânicos defendem que a nossa floresta deveria ser denominada fagosilva (por coerência com a primitiva laurisilva).
Existem mais de 600espécies da plantas lenhosas, na sua maioria de porte arbóreo, pertencentes a esta família que se divide em 8 géneros.Cada uma destas plantas apresenta flores pouco conspícuas de ambos os sexos. Os seus frutos (bolotas, castanhas,...) são secos, contendo apenas uma sementecada.São todas anemófilas, ou seja, o transporte dos seus pólens é garantido pelovento. Devido a este facto, crê-se que sejam plantas muito primitivas, uma vez que, tendo conquistado a terra, tiveram que desenvolver associaçõesreprodutivas com ajuda do vento, pois ainda não havia suficientes espécies de insectos polinizadores.
Mas a maioria das plantas lenhosas, bem como muitas das espécies lenhosas, bem como muitas das espécies herbáceas, dos ecossistemas ibéricos dependem dos serviços de polinização protagonizados pelos insectos. Estas são designadas plantas entomófilas. Nenhum exemplo é mais esclarecedor que o caso das abelhas – que são o grupo de insectos que mais desenvolveu estreitos laços correlativos com as plantas. Pois bem, a abelha “domesticada”, que produz o mel que consumimos e comercializamos, está longe de ser a única espécie de abelha que faz vibrar com zunidos os nossos campos; na Península Ibérica existem umas 1100 espécies de abelhas! Nenhuma outra região europeia se nos pode comparar neste aspecto. À escala mundial só perdemos para a Califórnia (que conta com cerca de 2000 espécies) e para o continente australiano (com umas 1600 espécies inventariadas).

Na viragem do primeiro milénio, por toda a Europa, a Igreja católica empenhou-se em domar a natureza silvestre, custeando o arrotear maciço e sistemático das florestas, conquistadas para terreno agrícola e para a edificação de novas urbes. (As zonas húmidas foram outro dos alvos prioritários que o Clero condenou à erradicação.)
No séc. XII começou a construção generalizada de grandes catedrais que, inevitavelmente, consumiram imensas árvores.
Dois séculos depois, com a “peste negra” a dizimar entre um terço a metade da população (humana) europeia, as criaturas selvagens puderam respirar de alívio e recuperar efectivos e territórios.

Outro marco de importância capital foi a Época das Conquistas, dos Descobrimentos, manutenção do império colonial e consequente expansão da indústria da construção naval. Foram construídas centenas de naus, principalmente nos séculos XV e XVI, com recurso predominante às madeiras denominadas “nobres” (carvalhos, azinheiras, sobreiros pinheiros-mansos e castanheiros). A construção de uma nau implicava, em média, o abate de 3000 árvores! Só na conquista de Ceuta foram envolvidas 200-300 embarcações, no comércio com a Índia 700 e com o Brasil 500...Ao todo abateram-se mais de 5 milhões de carvalhos. (No século XVI a Espanha possuía uma frota marítima equivalente a 300.000 toneladas de madeira, para tal foram necessárias 6 milhões de árvores de grande qualidade, o que representou o desaparecimento de 120.000 hectares dos melhores bosques. Essas embarcações duravam em média apenas 25 anos)
O estrépito de 5 milhões de carvalhos a serem abatidos deve ter soado como se se quebrassem os ossos de Portugal, e marcou um ponto de não retorno para os nossos ecossistemas florestais. Um dos seus principais símbolos era o urso pardo que foi extinto nessa época. (O sítio mais próximo onde reside uma população residual é nos bosques da Cordilheira Cantábrica.)

Abertura à exploração dos populares das tapadas e coutadas, por D. Manuel I (1498);
A expansão das culturas do cereal, da vinha, da batata e do milho (estas últimas, pela elevada necessidade de água, tiveram um papel predominante na destruição das galerias ripícolas);
A sobrepastorícia (muito acentuada após a expulsão dos Mouros da Península Ibérica, nos finais do século XV);
A construção de grandes edifícios religiosos;
O terramoto de 1755 (e consequente tsunami) que destruiu parcialmente Lisboa e outras localidades próximas, tendo exigido um consumo brutal de madeiras na sua reconstrução;
As invasões francesas no início do século XIX;
O processo de desamortizações - integração dos bens de raiz da Igreja nos Bens Nacionais, com alienação posterior para os privados, iniciados com a revolução liberal de 1820 e completadas mais tarde pele legislação republicana após 1910 – que transferiu muitas áreas da Igreja para as mãos de proprietários rurais que as converteram às culturas da vinha, do milho e do centeio. Processo com efeitos idênticos foi a privatização dos baldios(entre os finais do século XVII e do século XIX).
A construção do caminho de ferro iniciada no reinado de D. Pedro V, em 1856;
As duas grandes Guerras Mundiais (1914-18 e 1939-45);
As tristemente célebres campanhas cerealíferas iniciadas na década de trinta do século XX;
O ciclone de Fevereiro de 1941;
As plantações massivas de monoculturas de pinheiro-bravo e de eucalipto;
No século XIX deu-se o aparecimento da silvicultura industrial, com rígidos povoamentos monoespecíficos, ordenados, alinhados; com recurso a espécies de crescimento rápido, de fuste aprumado; assépticos e paupérrimos em biodiversidade; com espécies geneticamente desenhadas; aplanamentos e outras mobilizações de terras por meios mecânicos demasiado agressivos; fertilizantes e biocidas de síntese química, etc.., o que provocou uma situação de colapso ecológico agudo.
As pragas florestais (ex.: doença da tinta e cancro nos castanheiros, o míldio das azinheiras e a grafiose dos ulmeiros);
O flagelo dos incêndios (grande parte devido a negligência ou mesmo de origem criminosa) que pontuam o período estival com demasiada incidência sobretudo a partir de 1975.
A construção de várias barragens, com destaque para a do Alqueva (o maior lago artificial da Europa), que implicou o abate de 1 milhão e 300 mil árvores (incluindo 544 mil azinheiras e 34 mil sobreiros, árvores supostamente “protegidas” por lei).
Menos de 2% das florestas europeias encontram-se no seu estado original (de climax ecológico).
O número de áreas protegidas em toda a Europa são insuficientes para cumprir os objectivos das principais associações de conservação da natureza de proteger até ao ano 2005 pelo menos 10% de todos os tipos de bosques mediterrânicos.
Um estudo recente publicado pela Comissão Europeia declara que a saúde das florestas europeias continua a deteriorar-se de forma alarmante em consequência da poluição atmosférica, especialmente a procedente do tráfego rodoviário. 35% das árvores estudadas foram classificadas como “saudáveis”, 40% apresentaram debilidades fitossanitárias não demasiado graves e 25% foram consideradas “danificadas”.
Investigadores calcularam que as áreas tropicais à taxa anual de extinção ronda as 17500 espécies. Ou seja, cerca de 48 espécies extintas por dia ou duas por hora.
Recentemente o Reino Unido tornou-se no primeiro país do mundo que gere e certifica todos os bosques estatais (estimados nuns 800 mil hectares) segundo os princípios da exploração sustentável (FSC – Forest Stewardship Council).
Está em decurso a inventariação de todo o património botânico da Península Ibérica, com edição espanhola, mas em que participa o grande investigador do Instituto Botânico de Coimbra, Dr. Jorge Paiva. Como é óbvio, a obra estende-se por vários tomos e a sua conclusão poderá acontecer só daqui a duas décadas.
«A Flora Vascular está razoavelmente conhecida, sabendo-se que temos cerca de 3000 espécies, das quais 500 são introduzidas, sendo algumas infestantes (acácias, por exemplo) e estando a competir com as autóctones e a alterar ecossistemas nativos; a flora briológica está razoavelmente inventariada; os líquenes e fungos, assim como grande parte das algas, estão incompletamente recenseadas. Atribuem-se 7000 espécies de plantas para Portugal, mas é uma estimativa não garantida, pois, como vimos, há grupos mal inventariados.»
«Só nas plantas vasculares estão, provavelmente, já extintas 19 espécies, estando cerca de 120 em risco de extinção.» - Jorge Paiva (1996)
Os bosques que em todo o mundo "gozam" dalgum estatuto de protecção legal não chegam a 6% da área florestal cartografada.

«A chamada “floresta” não pode existir em Portugal desintegrada da agricultura, e deve fazer parte da estrutura ecológica da paisagem. Desta estrutura depende a permanência da fertilidade dos espaços cultivados, o equilíbrio biológico e o teor em matéria orgânica do solo vivo. A instalação e fixação das populações no território, em condições de dignidade, também depende, em muito, do quadro natural acima exposto.»
“(…) Os benefícios resultantes da presença das matas, montados, soutos e até dos pinhais, depende da sua integração nos agrossistemas e da sua influência nos aglomerados urbanos e em todas as restantes actividades que se exercem no território.” – Gonçalo Ribeiro Telles.
A área total de montado de sobro no nosso país aumentou consideravelmente: de 600 mil hectares em 1998 para os mais de 700 mil ha actuais. Segundo dados da Direcção-geral das Florestas (DGF) , entre 1994 e 2002 não só foramrearborizados (com sobreiros) 90 mil há, como também procederam-se amelhorias (essencialmente adensamentos) noutros 72 mil há de montado.

Os apoios comunitários de que Portugal tem beneficiado nas últimas (quase) duas décadas tiveram um papel preponderante na composição e dinâmica da área agro-florestal, nomeadamente assistimos a um aumento da silvicultura – que nem sempre se traduziu no grande disparate da eucaliptização maciça. O melhoramento dos montados e as rearborizações “de raiz” (efectuadas em solos anteriormente usados para fins agrícolas mas com fraca aptidão para tal, como foi contemplado no programa 2080/92) foram sem dúvida mais valias ecológicas e económicas.
Para continuarmos a incrementar a nossa área floresta teremos que resolver o problema do incipiente associativismo, dos proprietários absentistas (devido ao forte êxodo rural) e das pequenas dimensões das propriedades. A ausência de tradição nestas actividades é outro entrave que deveria merecer mais atenção por parte dos técnicos (ex: Os executores dos projectos, nomeadamente os empreiteiros florestais e os proprietários florestais, demonstram demasiadas vezes ignorância, oportunismo mercantilista que visa sempre o lucro imediato, e até falta de brio.)
Para além dos supracitados entraves à eficaz rearborização, constatamos, consternados, que, os repovoamentos florestais quase sempre se fazem com recurso a exageradas mobilizações de solo, o que tem por consequência a erosão e compactação do mesmo; e o que é pior, costuma destruir a regeneração natural (que deveria merecer maior atenção e apoio por parte de quem zela pelo sucesso do programa 2080/92) de árvores autóctones muito rústicas, como é o caso do carvalho-negral .

Os projectos de rearborização visando uma “floresta” com carácter de protecção e valorização ambiental (com destaque para as folhosas) contemplados pelo Programa 2080/92 (que, de certa forma, são a extensão de alguns objectivos das Medidas Agro-Ambientais) continuam a ser considerados pouco compensatórios pelos proprietários florestais;
Inicialmente o “Programa de Erradicação do Castanheiro” teve pouco sucesso porque os proprietários das árvores afectadas por essa doença sentiam que as compensações pecuniárias eram demasiado exíguas para justificarem o abate das árvores que ainda produziam castanhas. Por outro lado, os viveiristas não têm assegurado a idoneidade fitossanitária das plântulas que vendem, sendo que muitas delas já vêm contaminadas de origem, o que, no caso dos castanheiros, contribuiu para o alastramento de doenças devastadoras. Outras vezes, as plantas provenientes de viveiros estrangeiros (ex.: França) não vingam porque os seus códigos genéticos se pontuam por condições edafo-climáticas demasiado diversas das nossas.
O programa comunitário 2080/92 foi regulamentado para Portugal pela D.G.F., cujos técnicos se basearam na carta ecológica de Pina Manique e Albuquerque (1954). Infelizmente esse documento negligencia o tipo e actual estado dos solos de cada região.
Dentro destes parâmetros, os candidatos têm elegido as espécies de crescimento mais rápido (como seja o pinheiro-bravo) e/ou as que detêm o maior prémio pecuniário (como é o caso dos castanheiros), cujos povoamentos foram amiúde implantados em solos pouco aptos para o seu correcto desenvolvimento.



Como a D.G.F. demonstra uma falta de capacidade técnica para acompanhar os projectos desde o início, tem tentado apostar em campanhas de sensibilização que, a par do evidente insucesso de muitos projectos de particulares levados a cabo sem auxílio deste organismo estatal, têm cumprido os seus objectivos, uma vez que agora são os particulares por iniciativa própria que procuram o auxílio dos seus técnicos.
É uma pena (algo vergonhosa) que a D.G.F. não possua viveiros de espécies autóctones que possa fornecer em número suficiente para o Programa 2080/92 e para campanhas de sensibilização ambiental, nomeadamente junto de estabelecimentos de ensino por todo o país.
O Estado demarcou-se das suas competências, tendo-as transferido para os privados, porque a maior parte das áreas florestais pertence aos privados (87%); a estes últimos a D.G.F. apoiará iniciativas, tais como a criação de viveiros florestais. Só que este é um mercado muito instável e existe uma grave descoordenação entre quem produz e quem compra, o que resulta em frequentes e avultados prejuízos. Pior ainda é a falta de orientação e proteccionismo que a D.G.F. deveria assegurar aos proprietários florestais, pois a cada negociação dos Programas Comunitários os projectos param.
É também de lamentar que os P.D.M.s (Planos Directores Municipais) tenham uma vocação demasiado urbanista, não contemplando Planos de Ordenamento Florestal. Assim, a floresta que rodeia

espaço urbano, em vez de ser valorizada e até ser incorporada a este, sucumbe sempre à expansão urbanística. Mesmo dentro do perímetro urbano as zonas verdes poderiam ser a extensão dos corredores ecológicos previstos pela REN (Reserva Ecológica Nacional), com óbvios benefícios tanto para a fauna e flora selvagens, como para a qualidade de vida dos cidadãos. O Programa “`PÓLIS” (requalificação urbana e ambiental) poderá e deverá ter uma intervenção decisiva neste aspecto.
Esperemos que a Lei de Bases da Política Florestal tenha em breve consequências práticas significativas. Não faltam estratégias e programas (mais ou menos consistentes e bem intencionadas) para valorizar a nossa floresta. É necessário articular o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa com o Plano Nacional de Combate à Desertificação, com a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade. Também dever-se-á ter em conta os compromissos estabelecidos em Quioto relativos à Estratégia de Combate às Alterações Climáticas;
O ordenamento e gestão florestal deveria igualmente Ter um cuidado especial com as intervenções previstas para as áreas propostas para integrar a Rede Natura 2000
Planos Regionais de Ordenamento Florestal (PROF)
O Ministério do Ambiente ( através do seu documento “Estratégia Nacional para a conservação da Natureza”, 1999) realça a necessidade de se “ reduzir as ameaças à conservação dos bosques primitivos, nomeadamente através do desenvolvimento de técnicas O de exploração sustentável dos recursos; da integração dos bosques primitivos na classe de espaço ‘ Florestas de Protecção’ dos PDMs; da certificação de madeiras, lenhas e carvões provenientes da gestão sustentada dos bosques; da contratualização da gestão e/ou classificação dos bosques primitivos mais importantes; (...) recuperação e promoção dos bosques degradados, nomeadamente assumindo, através dos instrumentos de planeamento, a prioridade destas acções relativamente às arborizações de novas áreas”
É necessário apostar forte na análise e formação técnica, contemplado no Plano de Desenvolvimento Regional.
Assim, verifica-se que:
- aumento do sobreiro e outros carvalhos, por beneficiarem de medidas de apoio no âmbito da reforma da PAC – reg.2080/92 relativo à arborização de terras agrícolas (mas de fraca apetência para esse fim;
- diminuição da azinheira e das folhosas em geral, que passaram a ser encaradas sobretudo do ponto de vista ambiental e paisagístico;
- regressão do castanheiro (-18%), devido às doenças (tinta e cancro, que os têm dizimado implacavelmente), bem como do pinheiro-bravo, devido aos incêndios e à sobreexploração ;
aumento do eucalipto (+ 80%), que continua em franca expansão por todo o país, muitas vezes implantado à margem da lei!
“Enquanto os restantes países europeus tentam preservar e mesmo aumentar a sua floresta de espécies indígenas devido aos benefícios sociais e ambientais que daí advêm, Portugal mantém neste domínio uma postura perfeitamente ‘terceiro-mundista’, deixando degradar e descaracterizar os seus recursos florestais, o seu espaço rural e as suas paisagens, em nome da ‘livre iniciativa’ e do ‘enriquecimento a qualquer preço’ ”(Joaquim Sande Silva, 2000)
O 3º Quadro Comunitário de Apoio deverá Ter uma importância capital para a floresta portuguesa. É necessário melhorar os subsídios comunitários de apoio à rearborização com espécies autóctones de crescimento lento, até porque existem fortes lóbis por parte da indústria de celulose que visam o aumento do financiamento para a arborização com eucaliptos* – mesmo que tal contrarie os objectivos do Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa.

*Segundo o Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa (PDSFP) a área ocupada por eucaliptos em Portugal é de 700 mil hectares, mas os ambientalistas contestam esses números e dizem que, na realidade, são cerca de 1 milhão de hectares. Com todos os –imensos! - problemas sociais e ecológicos que as monoculturas de eucaliptos acarretam para o nosso país, é ultrajante que o III Quadro Comunitário de Apoio continue a financiar – a 30% - a implementação de eucaliptais!

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