terça-feira, outubro 20, 2009





Para os que ainda não conseguem ou não querem desintoxicar-se da merda da religião, aqui fica um exemplo de um homem extraordinário que realmente faz a diferença dentro da Igreja.



Entrevista com Dom Pedro Casaldáliga


RODRIGO VARGAS


Sua casa é pequena, simples e tem as portas sempre abertas. Nas paredes sem reboco, relíquias, pequenas lembranças, mensagens, panfletos e ilustrações tomam cada ponto do diminuto espaço. Dom Pedro Casaldáliga está em uma varanda arejada, circundada por luz e verde, onde dá retorno a algumas das centenas de cartas que tem recebido ao longo dos últimos dias.
É seu escritório, de onde se pode ver uma ainda mais modesta capela, erguida bem nos fundos do quintal. Quando recebeu o Diário, ele também preparava o envio de sua última e mais emocionada carta circular. "Pessoalmente sinto-me como quem espera num ponto de ônibus, sem saber bem nem a hora nem o destino imediatos, sabendo, porém, que continuaremos em comunhão a humilde viagem humana para a Casa paterno-maternal", diz, em um trecho da carta.
O bispo é um homem franzino e de saúde frágil. Tem pressão alta, audição auxiliada por aparelhos e sua mão direita revela continuamente o mal de parkinson. As convicções, porém, seguem tão firmes quanto nas primeiras vezes em que se manifestou em nome das milhares de vítimas anônimas do latifúndio.
"Passaram-se dois anos do novo século XXI e o Mundo continua cruel e solidário, injusto e esperançado. Ainda há guerra e há império, e o império acaba de inventar a guerra preventiva. Ainda o Mundo se divide pelo menos em três: Primeiro, Terceiro e Quarto. A fome, a pobreza, a corrupção e a violência têm aumentado; mas aumentaram também a consciência, o protesto, a organização, a vontade explícita de alternatividade".
Inquieto, respondeu às perguntas muitas vezes sem esperar que o repórter as concluísse. Falou abertamente do passado e do futuro, dos homens da guerra e das manifestações pela paz, deu conselhos a Lula, se emocionou ao tratar da própria morte e ainda reconheceu os próprios erros. Um relato franco sobre utopia, realidade, medo e esperança.
DIÁRIO - Como foi o impacto de, aos 40 anos, deixar a Europa para se embrenhar no interior de Mato Grosso?
Casaldáliga - É sempre brutal. Mas, felizmente, eu e um colega que vinha comigo, padre Manoel, fizemos o curso do CENFI (Centro de Formação Intercultural, organizado pela CNBB) para missionários estrangeiros. Fomos aprender a língua e também nos situarmos, ao menos inicialmente, na história e na cultura brasileiras. Foi muito bom porque chegamos em Mato Grosso um pouco vacinados ideologicamente, no melhor sentido da palavra. Porque se você vem de Madrid (capital da Espanha), onde passei meus últimos anos, diretamente para Mato Grosso, justo naquela época da ditadura militar, fica perdido, não tem nem idéia de onde está. Então esse curso nos dava, além de aulas de idioma, uma visão dos dois ou três ou vários brasis. Por outra parte você vinha aqui a um mundo perdido, que não tinha infra-estrutura nenhuma, até o ponto de que a primeira carta pastoral que eu escrevi, quando fui sagrado bispo, em 23 de outubro de 1971, ao ar livre, à beira do rio Araguaia, se intitula "Uma igreja da Amazônia contra o latifúndio e a marginalização social", porque o que a gente via é que o problema não era só o latifúndio, mas um total desamparo administrativo.
DIÁRIO - A conjuntura política também contribuiu para esta tomada de posição? Este documento é quase uma declaração formal de guerra.
Casaldáliga - Aquela era uma América Latina em plena época de ditaduras militares, de perseguição religiosa e, particularmente, de perseguição a nós aqui na Prelazia de São Félix do Araguaia, pelo nosso posicionamento frente às injustiças e na defesa do índios, dos posseiros e dos peões. Era a luta contra o latifúndio patrocinado por uma ditadura militar. E era significativamente nesta região, porque de Barra do Garças até a divisa do Pará, esta área toda, o nortinho de Mato Grosso, era pioneira dos incentivos fiscais patrocinados pela Sudam. Então você ir contra o latifúndio, era ir contra o sistema, o regime, o que desencadeava a ira da polícia, do exército e da ditadura. Então todas as grandes fazendas, a Suiá-missu, a Codeara, a Santa Terezinha, a Bordon, eram nossas inimigas porque eram inimigas dos índios, dos posseiros e dos peões. Quando eu escrevi em um poema "maldito seja o latifúndio, e a Sudam, sua amancebada", eu já demonstrava que a situação era muito séria. Tanto que foi aqui que surgiu a idéia do que futuramente seria a Comissão Pastoral da Terra (CPT). A gente percebeu que o que estávamos vivendo aqui ia se espalhando pelo Sul do Pará, pela região norte de Goiás, hoje Tocantins.
DIÁRIO - Os conflitos de terra no Araguaia eram um prenúncio do destino de toda a Amazônia?
Casaldáliga - Correto. Não havia fiscalização nenhuma. A Sudam era a prostituta do latifúndio, com o perdão das prostitutas. E o povo inerme, indefeso, não tinha organização, não tinha sindicato, enquanto as forças todas, políticas, judiciárias e militares estavam a favor do latifúndio. Você podia apelar a quem? A Deus e aos mortos. E aqui nesta região nós temos concretamente dois direitos de terra: o de compra, que é titulado no papel, e o de posse, que é suado e escrito nos calos. Mas na hora da verdade, com suas malandragens nos cartórios, você sabe quem prevalece. O primeiro presidente da Funai, logo após a extinção do SPI (Serviço de Proteção ao Índio, extinto em 1967) me falou que no Parque Indígena do Xingu havia uma área com três títulos de terra sobrepostos. Isso na área sagrada dos índios. Agora, imagine em outros lugares. O governador Garcia Neto chegou a declarar em uma revista de circulação nacional que se Mato Grosso tivesse que cumprir as exigências de títulos de terra que constavam nos cartórios, haveria necessidade de se invadir uma parte do Pará e outra de Goiás.
DIÁRIO - Muitas pessoas, inclusive dentro da igreja, criticam o posicionamento tido como radical da Prelazia. Como o senhor responde a essa afirmação?
Casaldáliga - Olha, em áreas conflitivas é muito difícil, por um lado, a demarcação dos campos e, por outro, a equanimidade, pois tudo é quente. Você não pode andar com meias tintas. É preciso deixar claro de que lado você está. Então nós éramos maldosamente chamados de comunistas, terroristas, diziam que estávamos envolvidos com a guerrilha no Pará. Advertiam a quem chegava: cuidado com a Prelazia, cuidado com o bispo. Tudo porque, na época, se não organizássemos nós, não organizaria ninguém. Isso fez com que o próprio povo tivesse de optar: com a prelazia ou contra a prelazia. Até mesmo nas campanhas eleitorais. O próprio MDB da época, que era a única oposição pública que havia, foi considerado o partido da prelazia. E, afinal de contas, nós não patrocinávamos um partido, mas a reivindicação de um povo, no seu direito a reclamar o seu direito. Depois foi chegando mais gente de fora, baixaram as águas, se multiplicaram os partidos, o governo, bem ou mal, passou a uma democracia formal pelo menos, o país foi se organizando em sindicatos e associações, ongs. Então já não é a Prelazia a única a falar. Já não temos que substituir ninguém. Hoje, sempre quando surge um problema de terra, eu digo: procure o sindicato, procure o Incra. Na época, além de nós, os pequenos não podiam procurar mais ninguém.
DIÁRIO - Há contudo mazelas e carências que ainda persistem. Como o senhor vê a região do Araguaia após estes 35 anos?
Casaldáliga - A falta de infra-estrutura continua. A falta de reforma agrária que seja também reforma agrícola e que vá à raiz, acabando com o latifúndio, também. Eu tenho uma convicção, a tenho repetido várias vezes e até hoje ninguém me desmentiu: desde que cheguei aqui, nestes 35 anos, de Barra do Garças até a divisa com o Pará, onde termina a Prelazia, foi desmatado e queimado 80% do território. Houve uma época em que desafiamos algumas autoridades federais a apontar uma só fazenda em toda a Amazônia Legal que tivesse cumprido com aqueles requisitos que teoricamente se exigem, como respeitar a área de mata, favorecer o emprego de mão de obra e produzir o que se dizia. Esta fazenda nunca nos foi mostrada. São só léguas e léguas de queimadas e destruição. A fiscalização tem sido ou nula, ou corrupta, ou sem estrutura. Às vezes, funcionários destas autarquias oficiais não têm carro ou lhes falta combustível para atender uma área infinita. Tanto o Incra, quanto o Ibama e a Funai, com muitíssima freqüência, estão desaparelhados.
DIÁRIO - Segundo a própria CPT, também persiste a escravidão.
Casaldáliga - Aqui mesmo na região temos tido recentemente casos de escravidão nos municípios de Santa Terezinha, Vila Rica e Confresa. E este trabalho contra o trabalho escravo que faz a CPT é sobretudo no Norte de Mato Grosso, no Sul do Pará e no Tocantins. O primeiro documento que eu fiz, no ano de 1970, intitulado "Feudalismo e Escravidão no Norte de Mato Grosso", foi um primeiro grito contra essa escravidão que, à época, não se tratava de um caso ou outro caso. Era o sistema, era o regime. O latifundiário trazia 70 a 80 peões de um povoado do Piauí, por exemplo. Aí jogavam na fazenda, sem direito trabalhista. Às vezes, os peões recebiam um tipo de vale para comprar mercadoria nos próprios armazéns da fazenda e, ao fim do contrato, ficavam endividados com a fazenda. O bacharel Francisco de Barros Lima, então chefe de inquéritos do centro-oeste da Polícia Federal, disse textualmente que na fazenda Codeara viu o maior caso de escravidão branca da história do Brasil. Isso em plena ditadura militar, dito pelo mesmo chefe de polícia que comandou a operação de prisão dos nossos agentes pastorais.
DIÁRIO - Nesta mesma perspectiva, qual o resultado das políticas de integração da Amazônia implementadas na região?
Casaldáliga - Em resumo: veio muito dinheiro, mas não o desenvolvimento. Muitas vezes porque os incentivos fiscais que se davam ao latifúndio não eram investidos aqui, mas nas próprias empresas que os ditos fazendeiros tinham no sul e sudeste. Várias dessas fazendas eram de bancos. A Codeara, por exemplo, era do Banco Nacional de Crédito (BCN).
DIÁRIO - É verdade que o Vaticano também era um latifundiário?
Casaldáliga - A história real é a seguinte: o último dono da fazenda Suiá-Missu foi a empresa italiana mista Eni-AGIP, da qual o Vaticano teve ações. Isso nos enchia a paciência, porque os inimigos e o povo achavam que a fazenda era do papa. Inclusive me chegou a seguinte versão: o papa comprou a Suiá Missu e a deu para o bispo repartir com a pobreza. Quando estive na CPI da Terra, no Congresso Nacional, os deputados me perguntaram e eu felizmente já havia me informado bem antes com o núncio do papa, que me respondeu diplomaticamente: se haviam ações, já não as havia mais. Aos inimigos era bom porque eles diziam: olha só, o papa tem a fazenda Suiá Missu, porque o bispo Pedro não protesta contra ele?
DIÁRIO - Suiá-Missu por suas dimensões, poderia ser considerada um símbolo de tudo que de errado ocorria na região?
Casaldáliga - Sim, porque era uma fazenda grande, que na época chegou a ser a maior fazenda de gado da América Latina. Chegou a ter três mil peões, em uma época em que São Félix tinha pouco mais de 600 habitantes. Ali o regime era de escravidão mesmo. Havia uma curva de estrada pouco antes de chegar à Suiá, com um precipício, uma espécie de grota como uma cratera. Na época mais dura da Suiá Missu, os peões diziam que aquele era o passeio do papai. Pegavam peões, matavam e jogavam os corpos lá. Apesar de tudo, aquela fazenda era para muitos como uma mãe, porque dava emprego. Esse mundo da peonada do trecho é dos mais dramáticos. Eles diziam: eu não tenho nem um passarinho para criar, a minha casa é o meu chapéu. Morriam muitos de malária, muitos matados, às vezes por pistoleiros, às vezes entre eles mesmos. Quando vinham aqui para São Félix, era só para bebedeira, prostituição e violência. Isso também mudou muito pouco.
DIÁRIO - Além de posseiros e peões, os senhor se notabilizou mundo afora por defender a causa indígena. Hoje o que isso significa?
Casaldáliga - A problemática indígena continua sendo a demarcação e a garantia das terras. E também evitar a ameaça que supõe a hidrovia e certas hidrelétricas. É preciso possibilitar a educação bilíngüe e o atendimento à saúde, rever formalmente a situação da Funai, e possibilitar em nível federal o novo Estatuto do Índio, que depende do congresso. Estamos continuando atendendo o povo Tapirapé, o povo Carajá também. Tem pessoal nosso que trabalha em consórcio com a Funasa em saúde indígena.
DIÁRIO - Houve aumento populacional nas aldeias. A situação hoje é melhor?
Casaldáliga - É claro que sim. Eram 200 mil em todo o país, agora são 500 mil índios. Vários têm reconquistado a terra, outros tantos estão revalorizando a cultura. Mas continua a existir o encontro e o choque com a nossa civilização, para mal e para bem. Porque também não se trata de deixar os índios num museu. O ideal seria que fosse não a integração do índio, mas a interintegração. O primeiro conceito significa absorção de uma cultura pela outra, já o segundo quer dizer o diálogo, a complementação. Eu posso aprender dos índios o amor à natureza, uma certa gratuidade e um espírito comunitário. A cultura branca pode contribuir com a sua experiência e sua técnica. Respeitar as identidades, numa convivência pacífica e plural, sabendo que o Brasil, até mesmo por constituição, é pluriétnico e pluricultural. É obrigação do Governo facilitar pluriculturalidade. Não está fazendo nenhum favor ao índio. É seu direito. Por outro lado, felizmente, eles têm crescido em organização, com suas associações, federações, confederações, inclusive em nível latinoamericano.
DIÁRIO - Por falar em governo, o que o senhor espera do presidente Lula?
Casaldáliga - O que eu peço a Lula é que continue sempre voltado para o povo, a serviço do povo. Já tivemos muitos governos anti-povo e muitos populistas. Seja ele então um governo popular. Segundo ponto: seja bem brasileiro e bem latino-americano e ajude o Brasil a se latinoamericanizar. Que privilegie ao máximo o Mercosul, saiba contestar a Alca e independize o Brasil dos Estados Unidos da América do Norte. Agora tudo isso é preciso ser executado em concreto".
DIÁRIO - O Fome Zero é acusado de ser ao mesmo tempo populista e assistencialista.
Casaldáliga - Eu entendo que às vezes é preciso se fazer gestos que são assistenciais. Só que estes não podem substituir nem a reforma agrária, nem a tributária nem a da previdência. Muitos ficam em dúvida sobre dar o peixe ou ensinar a pescar. Eu digo que tem que dar peixe, ensinar a pescar, às vezes tem de ensinar onde está o rio e tem de ajudar a conquistar o rio também, pois ele geralmente está nas mãos de três ou quatro oligarcas. Tem que conquistar o rio, senão continuaremos sempre submetidos a salários de fome, aposentadorias de fome, dívidas externas e ao capricho de impérios e oligarquias.
DIÁRIO - Mas os primeiros dias não têm sido, como os reclamam os próprios colegas de partido, moderados demais?
Casaldáliga - Eu sei que, como ele ganhou por alianças, são inevitáveis certas concessões. Eu também sei que nem todos os ministros pensam como Lula, mas torço para que ele mantenha o cabresto. Eu acho até bom também que continue um grupo radical para cutucar, cobrar, recordar, sempre que não faça o jogo do inimigo. Uma coisa é a política utópica, outra é a administrativa. Agora, nunca se pode negar a utopia, embora ela tenha se ser contida em um ritmo de administração. A utopia não tem ritmo, mas a administração tem.
DIÁRIO - No plano internacional, como o senhor tem acompanhado a iminência de uma guerra contra o Iraque?
Casaldáliga - Uma política imperialista, de terrorismo hegemônico, além de uma total estupidez. Essa guerra, como poucas, é ao mesmo tempo homicida e suicida. Os próprios EUA estão se desmoralizando frente ao mundo. A Europa, que estava tão submissa, já está contestando. A sociedade civil, mesmo em território americano, contesta significativamente. Na Inglaterra, mais de 70% são contra. Mas os EUA têm necessidade de que esta guerra aconteça, para que possam investir na fabricação de armas e ainda assegurar o petróleo e o domínio do Oriente Médio. Esta guerra é uma guerra de negócio, armas e petróleo. Saddam é só uma grande desculpa. Eu conheço a Guiné Equatorial, por exemplo, e os EUA se dão bem com o ditador de lá, porque ele deixa que os americanos assumam o controle do petróleo. O próprio Saddam Hussein foi criado por eles, os ditadores da América Latina foram criados por eles. A Inglaterra tinha o Pinochet, aquele ditador sanguinário do Chile, e o deixou ir. Agora quer livrar o Iraque da ditadura? É perversidade, cinismo e burrice, tudo junto. E o que é pior, em nome de Deus, o que já se torna blasfêmia.
DIÁRIO - A justificativa oficial também passa pelos atentados de 11 de setembro.
Casaldáliga - Que é nada mais que um dos muitos atentados que estão acontecendo na história da humanidade. Eu lamento profundamente a morte daquelas 3 mil pessoas, mas, pergunto, o que está acontecendo na África? Quem manda as armas à África? Quem suga seus diamantes? Quem sustenta seus vários tiranos? Por isso eu acredito cada vez mais na Internacional Humana, que é a sociedade civil se unindo, reagindo. Acredito cada vez mais no diálogo intercultural. Neste sentido, é um tempo de esperança. Honestamente, acho que está amanhecendo um novo tempo. Não é só retórica, eu digo isso com toda a sinceridade. Só na minha cidade de Barcelona, a marcha pela paz reuniu 1,3 milhão de pessoas. E foi assim em várias cidades do mundo. Esses senhores governantes serão obrigados, por bem ou por mal, a considerar o povo.
DIÁRIO - O fortalecimento de iniciativas como a do Fórum Social Mundial são parte desse processo ?
Casaldáliga - Acho que está se configurando o que se chama de altermundialidade, frente a uma globalização capitalista, neoliberal, do mercado total, de privilégio por um lado e exclusão de outro. Esse movimento de reação é bem significado pelo lema do Fórum Social Mundial, "Um Outro Mundo é Possível". Essa alteridade mundial é um outro mundo, que significará uma outra ONU, em uma nova relação entre os povos. Isso já está surgindo, facilitado também pelas comunicações. Alguém me dizia outro dia, que os famosos panfletos de uma época, agora estão sendo substituídos com uma grande vantagem pela internet. É um avanço positivo.
DIÁRIO - Qual o papel das religiões na construção desta via alternativa ?
Casaldáliga - Um teólogo suíço, Hans Küng, diz que não haverá paz no mundo se ela não existir entre as religiões. E que não haverá paz entre as religiões se falta diálogo entre elas. Então eu acrescento: e se o diálogo entre as religiões não versa sobretudo para as grandes necessidades da humanidade. Porque não adianta nada reunirem-se as religiões como uma tertúlia de amigos, esquecendo-se da fome, da guerra, da destruição ambiental e das migrações. O grande problema que tem Deus é a humanidade. Quem acredita que este Deus está vivo, tem que ajudá-lo a resolver os problemas da humanidade.
DIÁRIO - Esse momento novo contraria uma tese que, de alguma forma, simboliza o momento da queda do muro de Berlim, quando o pensador americano Francis Fukuyama apontou o fim da História.
Casaldáliga - Em primeiro lugar, ninguém, fora Deus, sabe o princípio e o fim da História. Em segundo lugar, eu posso lhe assegurar que há muita História pela frente. Até mesmo porque é muita ignorância e petulância pensar que ter chegado ao capitalismo neoliberal é ter ido ao máximo, que não há mais como ir além. O fim da história para Fukuyama significa exatamente isso: chegamos ao plus, ao plus ultra, não tem nada mais alto que isso. Se for verdade, é muito triste o fim da História. É um final desgraçado, porque a máxima parte da humanidade hoje é excluída. Não é com certeza um final feliz. Mas realidade se impôs rapidamente. Os últimos dias mesmo apontam uma perspectiva de uma nova política internacional da Europa, que vai se desprendendo cada vez mais dos EUA. Isso é bom para nós. É bom, por exemplo, que o Brasil se relacione com a Índia, com a China, com a Coréia, com a África. Que abra outros laços, para deixar de lado a hegemonia americana.
DIÁRIO - Voltando à esfera da Prelazia, como têm sido estes dias de transição e despedida?
Casaldáliga - Estou bastante despreocupado, bastante tranqüilo, porque agora só tenho de entregar a renúncia e nada mais. A partir daí, tudo depende do papa nomear um sucessor. É lógico que eu gostaria que houvesse continuidade na opção que temos feito. Mas se vier outro que ache que não, também será bom, para que se corrija o que temos cometido de erros. Reconheço que talvez tenhamos sido radicais demais da conta, talvez não tenhamos sido compreensivos em alguns momentos. Em outros, acho que fomos tímidos demais.
DIÁRIO - O senhor continua em São Félix?
Casaldáliga - Eu só sei que para a Europa não volto. Meu destino é o Terceiro Mundo, a América Latina e, bem possivelmente, o próprio Brasil. Vai depender muito de meu sucessor. Se o bispo que for nomeado para cá for da minha linha, eu posso ficar na região, sem problema. Agora, se é uma pessoa desconhecida ou que opina diferente, o mais certo é eu sair de São Félix. O meu sonho mesmo era ir à África, morrer lá. Seria uma contribuição, uma pequena contribuição, uma presença, deixar os ossos, a paixão e a esperança na África. Só que não estou bem de saúde, tenho problema de pressão, que anda muito descontrolada e alta, tenho parkinson. Então, para ir ate lá e dar trabalho aos outros, eu não quero. Mas, mesmo não indo, eu já tenho falado bastante, tenho escrito muitas coisas e deixo a minha paixão da África espalhada por aí. Outros vão, outros irão.
DIÁRIO - Em sua carta de despedida, há alguns versos que falam de persistência e luta. Às vésperas da aposentadoria, qual o significado dessa mensagem?
Casaldáliga - Eu achei que, nesta hora, um fragmento da peça "O Homem de La Mancha" define bastante o momento que todos estamos vivendo. Ele diz: Sonhar mais um sonho impossível (que é este outro mundo possível de que falamos tanto). Lutar quando é fácil ceder (primeiro porque estou me aposentando e segundo porque tem gente que já se cansou de tantas lutas). Vencer o inimigo invencível (que bem poderia ser o capitalismo neoliberal). E aí vem um trecho que considero bastante bonito e emotivo: Se esse chão que beijei (que é definitivamente a América Latina e esse Mato Grosso) for meu leito e perdão, vou saber que valeu delirar... (o bispo emudece por longos segundos, enquanto lágrimas caem de seu rosto) e que apesar de tudo, valeu a pena.

DIÁRIO - O senhor acha que venceu algum destes inimigos invencíveis de que falam os versos?
Casaldáliga - A grande verdade é que só vence aquele que continua, aquele que persiste, aquele que tem esperança e sabe passar a bandeira às novas gerações. Eu continuo cada vez com mais esperança. Essa é a minha vitória
FONTE: DIÁRIO DE CUIABÁ - 23/02/2003
Dom Pedro Casaldáliga
Publicado Agosto 31, 2009 Jornalismo , Política(s) ,

Entrevista feita por Nilton Viana do Brasil de Fato

Nesta entrevista ao Brasil de Fato, Casaldáliga fala do “absurdo criminal de constituir a sociedade em duas sociedades de fato: a oligarquia privilegiada, intocável, e todo o imenso resto de humanidade jogada à fome, ao sem-sentido, à violência enlouquecida”. Defende que, hoje, só a participação ativa, pioneira, de movimentos sociais pode retificar o rumo de uma política de privilégio para uns poucos e de exclusão para a desesperada maioria. E adverte: o latifúndio continua a ser um pecado estrutural no Brasil e em toda Nossa América.

Brasil de Fato – Como o senhor tem visto a devastadora crise que já afeta todos os países e principalmente a classe trabalhadora?

Dom Pedro Casaldáliga – Com muita indignação e revolta; com uma sensação de impotência e ao mesmo tempo a vontade radical de denunciar e combater os grandes causadores dessa crise. Esquecemos fácil demais que a crise fundamentalmente é provocada pelo capitalismo neoliberal. Irrita ver governantes e toda a oligarquia justificando que as economias nacionais devam servir ao capital financeiro. Os pobres devem salvar economicamente os ricos. Os bancos substituem a mesa da família, as carteiras da escola, os equipamentos dos hospitais…
Eu estava comentando ontem [19 de dezembro] com uns companheiros de missão que a avalanche de demissões acabará justificando uma avalanche de assaltos, por desespero. Está crescendo cada dia mais o absurdo criminal de constituir a sociedade em duas sociedades de fato: a oligarquia privilegiada, intocável, e todo o imenso resto de humanidade jogada à fome, ao sem-sentido, à violência enlouquecida. Fecham-se as empresas, quando não conseguem um lucro voraz, e se fecha o futuro de um trabalho digno, de uma sociedade verdadeiramente humana.

Como o senhor analisa o papel dos movimentos sociais frente à atual conjuntura?

Casaldáliga - Já faz um bom tempo que, sobretudo no Terceiro Mundo (concretamente no nosso Brasil, na Nossa América), se vem proclamando por cientistas sociais e dirigentes populares que hoje só a participação ativa, pioneira, de movimentos sociais pode retificar o rumo de uma política de privilégio para uns poucos e de exclusão para a desesperada maioria. Os partidos e os sindicatos têm ainda sua vez; devem conservá-la ou reivindicá-la. Sindicato e partido são mediações políticas indispensáveis; mas o movimento social organizado, presente no dia-a-dia do povo, é sempre mais urgente, como uma espécie de “vanguarda coletiva”.

Diante deste cenário, na sua avaliação, quais são as alternativas para os pobres do mundo hoje?

Casaldáliga – A alternativa é acreditar mesmo que “Outro Mundo é Possível” e se entregar individualmente e em comunidade ou grupo solidário e ir fazendo real esse “mundo possível”. O capitalismo neoliberal é raiz dessa crise e somente há um caminho para a justiça e a paz reinarem no mundo: socializar as estruturas contestando de fato a desigualdade socioeconômica, a absolutização da propriedade e a própria existência de um Primeiro Mundo e um Terceiro Mundo, para ir construindo um só Mundo, igualitário e plural. Com freqüência respondo a jornalistas e amizades do Primeiro Mundo que somente a construção de um mundo só (e não dois ou três ou quatro) poderá salvar a humanidade. É utopia, uma utopia “necessária como o pão de cada dia”. Onde não há utopia não há futuro.

No próximo mês de janeiro o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) completa 25 anos. O senhor, como incansável defensor dos camponeses pobres e inspirador do movimento, vê hoje a luta pela terra de que maneira?

Casaldáliga – O MST completa, então, seus 25 anos de luta, de enxada, de poesia, de profecia ao pé da estrada e da rua. Segundo muitos analistas o MST está sendo o movimento popular melhor organizado e mais eficaz “de fato”. Sabe muito bem o MST que “a terra é mais que terra”, e por isso está se volcando, pertinaz, esperançado, na conquista comunitária da terra, na educação de qualidade, na saúde para todos, numa atitude permanente de solidariedade, em colaboração gratuita e fraterna com todos os outros movimentos populares.

Que mensagem o senhor diria hoje para os milhares de trabalhadores e militantes do MST espalhados por todo o país?

Casadáliga – Os 25 anos do MST são uma data a celebrar, dando graças ao povo da terra e ao Deus da terra e da vida, reafirmando os princípios que norteiam o objetivo e a prática do MST. Recordando a palavra de Jesus de Nazaré: “não podeis servir a Deus e ao dinheiro”; não podeis servir ao latifúndio e à reforma agrária. O latifúndio continua a ser um pecado estrutural no Brasil e em toda Nossa América.

O senhor tem dito que “Para um socialismo novo, a utopia continua”. Quais devem ser os caminhos (ou o caminho) para seguirmos na construção desse socialismo novo e garantir sempre que a utopia continue?

Casaldáliga - Que o MST continue a ser um abanderado desse “socialismo novo” e de uma verdadeira reforma agrária e agrícola, inserido na Via Campesina, na procura e no feitio de uma nova América. Que mantenha viva e produtiva de esperança a memória dos nossos mártires, sangue fecundo, os melhores companheiros e companheiras da caminhada. Que siga entrando, plantando, cantando, contestando, com aquela esperança que não falha porque tem inclusive a garantia do Deus da Terra, da Vida, do Amor.
D. Pedro Casaldáliga - A liberdade do Evangelho
Por: PAULO PEREIRA LIMA, Jornalista, em S. Paulo (Brasil)



Ameaçado de morte, o bispo católico Pedro Casaldáliga prepara-se para deixar São Félix do Araguaia, após uma vida em defesa dos povos indígenas e posseiros e marcada pela repressão. Doente, enfraquecido, não se dá por vencido. E diz com a clareza de quem nunca desistiu da liberdade: «Se olhássemos mais para o Evangelho, a vida seria muito mais simples».



«Deus é grande, mas a mata é maior»



Este catalão de Balsareny, chegou a São Félix em plena ditadura militar, em Julho de 1968. Exemplo de coragem, foi o primeiro a denunciar a existência de trabalho escravo no Brasil. E fê-lo durante a ordenação de bispo, em Outubro de 1971, quando divulgou a sua primeira carta pastoral: Uma Igreja da Amazónia em conflito com o latifúndio e a marginalização social.

A partir dessas denúncias, tornou-se uma referência para os movimentos de oposição à ditadura, mas também alvo de ataques, pelo facto de ser encarada como foco de guerrilha. «Aqui não houve guerrilha, foi mais ao sul do Pará, onde actualmente é o estado de Tocantins. Os militares estavam convencidos de que éramos sustentáculo eclesiástico da guerrilha. Apanhámos, fomos presos, torturados, expulsos», lembra o bispo, também fundador de duas das principais pastorais sociais da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB): a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e o Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

A sua tomada de posição incomodou os fazendeiros, o Governo militar e até bispos brasileiros e o Vaticano. Acusado de comunista e subversivo, fartou-se de receber ameaças de morte, escapou a emboscadas, respondeu a inquérito militar, sofreu cinco processos de expulsão e foi preso. Diante das tentativas de expulsão, costumava repetir aos amigos uma frase que ouviu a um líder comunitário: «Deus é grande, mas a mata é maior», referindo-se à possibilidade de se esconder na floresta.

Terminados os tempos verde-azeitona [ditadura militar, ndR], em meados dos anos 80, procurou estreitar os laços de solidariedade com a América Central. Apoiou a revolução sandinista da Nicarágua e as forças de oposição em El Salvador, Guatemala e Honduras.

Pela sua trajectória de paladino dos direitos humanos no Brasil e na América Latina, D. Pedro recebeu diversos prémios e homenagens, no Brasil e no exterior.



Aos 76 anos completos e esperando pelo sucessor, D. Pedro Casaldáliga, bispo de São Félix do Araguaia, continua a testemunhar o amor aos povos indígenas, mesmo que isso represente ameaças de morte. Segundo a Polícia Federal, que o escolta 24 horas por dia, a cabeça do bispo está cotada pelos pistoleiros de aluguer em cerca de 60 mil reais (20 mil euros).

Juntamente com a senadora Serys Slhessarenko, do Partido dos Trabalhadores, e líderes indígenas do Alto Boa Vista, estado do Mato Grosso, Casaldáliga tem sofrido ameaças de morte nos últimos meses, devido ao conflito entre fazendeiros e índios Xavantes na região. Apoiados pelo religioso e pela senadora, os Xavantes lutam desde Novembro pela recuperação de uma área de 170 mil hectares, demarcada e homologada como área indígena, mas actualmente ocupada por cerca de 700 famílias de fazendeiros.

Missionário da congregação dos Claretianos, Casaldáliga está à frente de São Félix há 36 anos. A diocese, com poucos recursos, tem 150 mil quilómetros quadrados e fica no coração da Amazónia. Uma vida marcada, sobretudo, por testemunho, repressão e incompreensão.

Casaldáliga está a seguir uma dieta rígida, devido aos «problemas da velhice». Como se não bastassem a pressão alta e as crises de malária que o deixam mal-humorado, luta contra os sintomas da doença de Parkinson, a mesma que aflige o cardeal Paulo Evaristo Arns e o Papa João Paulo II. «Estou bem acompanhado», graceja.

Perguntamos-lhe: quando chegar o sucessor, sai de mala e cantil, como um bom missionário? Responde: «Se for um bispo mais ou menos na mesma linha pastoral, eu posso ficar. Se for diferente, é melhor que eu saia para não criar tensões. Eu deixo um pouco nas mãos de Deus e das circunstâncias.»



D. Pedro, como está a ser resolvido o conflito?

As terras indígenas foram ardilosamente ocupadas pela multinacional italiana Agip, que as revendeu aos fazendeiros. É insustentável que os cerca de 400 Xavantes fiquem na estrada durante todo este tempo. E hoje tanto os políticos locais como os empreendedores agrícolas têm grande interesse nelas para produção de soja. O caso está na justiça, que, em Março, vai ouvir ambas as partes. Achamos que as ameaças de morte contra mim, contra a senadora Serys e os líderes indígenas vêm desses grupos. Soube hoje de uma fonte segura que estão a oferecer 60 mil reais pelas nossas vidas.



Diante dessas ameaças, o que sente?

Procuro nunca andar sozinho. A Polícia Federal faz a minha segurança, mas peço que não seja ostensiva, para não criar ainda mais tensão. No entanto, continuo a dormir tranquilo, escrevendo poesia, sonhando. Em relação à solução do conflito, para mim, a primeira e a última palavra é esperança. A esperança é um bem comum e escatológico da humanidade.



Uma vez, o senhor disse que o rio Araguaia é um rio meio anárquico, é cheio de curvas e não segue uma linha recta. O senhor também se sente, de alguma forma, anarquista?

Vivo na Amazónia, um mundo aberto, livre. Se ser livre é ser anarquista, então eu considero-me um anarquista. Sobretudo quando procuro evitar tudo o que cheira a burocracia excessiva. Dentro da Igreja, sem querer dar lições a ninguém, sinto que há demasiado tempo pesam muito os títulos «Sua Santidade», «Sua Excelência». Conta muito o protocolo. Se olhássemos mais para o Evangelho, as nossas vidas seriam muito mais simples. Nesse sentido, o Vaticano não deveria ser um Estado nem o Papa um chefe de Estado, mas um animador da Igreja, um coordenador de dioceses. Desse modo, a vida seria muito mais simples e acessível.



Tem procurado implementar uma pastoral ligada à Teologia da Libertação e às comunidades de base.

Procuramos ser bastante comunitários. O voto do bispo vale tanto como o de qualquer leigo, religioso ou padre. Procuramos respeitar o que é fundamental, porque a autoridade não se conquista pela imposição, mas pelo serviço.



Nos últimos 30 anos, tornou-se uma referência para outras igrejas e para os leigos de outras partes do Brasil e do exterior.

Não diria ponto de referência. Simplesmente, ficámos muito em evidência porque o tempo e a nossa área de trabalho coincidiram com a entrada do capitalismo no terreno. Certamente que o facto de termos denunciado as injustiças sociais tornou o nosso trabalho mais conhecido.



Dessa experiência com o povo, quais as lembranças mais fortes?

No contacto com a gente, especialmente com os índios, os sem-terra e os posseiros, vi o quanto eles são vítimas do latifúndio. Esse foi o primeiro choque que tive e que continua até hoje.



O oitavo sacramento



Que sentido dá aos seus 26 livros publicados e à sua poesia?

Procuro registar no papel as nossas histórias de vida e também aproveito para desabafar um pouco. Escrevo também para comunicar-me com os amigos e as comunidades, como forma de agradecer pela solidariedade que têm para connosco.



Solidariedade também económica?

Sim. A prelazia sobrevive muito com a ajuda do exterior. O mais belo disso tudo é que essa ajuda vem de comunidades pobres e comprometidas do Norte do mundo, de gente que trabalha e reserva um pouco do salário para ajudar o Terceiro Mundo. Costumo dizer que o Primeiro Mundo só se salvará sobretudo a partir do sacramento da solidariedade. Este é o oitavo sacramento para um cristão.



Que balanço faz dos 36 anos de actividade? Que pontos melhoraria?

Primeiro, rezaria mais e uma oração mais serena. Procuraria também ser mais pobre e simples, o que representaria também mais liberdade de espírito.



Em Fevereiro, os movimentos sociais pediram à Conferência Episcopal Brasileira para participar na coordenação de movimentos sociais a fim de pressionar o Governo Lula. Que acha disso?

O que realmente pode mudar a rota do nosso Governo é a «cobrança», a pressão popular. E o facto de a CNBB participar nesse movimento só vai ajudar a mudar a política económica do Governo.



Depois do primeiro ano do Governo Lula, o senhor continua a dar-lhe um voto de confiança?

Dei um voto de confiança logo no começo do Governo. Agora, daria um voto de confiança, só que um pouco desconfiado. Sentimos ainda a insistência com a tal segurança económica.



É um dos promotores da ideia de um novo concílio para a Igreja. Tem recebido outros apoios?

Está a crescer o número de adesões em todo o mundo por parte de bispos e teólogos. Recentemente, por exemplo, o teólogo Hans Küng manifestou-se a favor. Insistimos muito na importância do processo de criar na Igreja uma atitude conciliar, suscitar a vontade e a esperança de um grande evento para sacudir a Igreja.



O que espera do seu sucessor?

Apresentei ao Papa a minha renúncia em Fevereiro do ano passado. Aguardo a nomeação do meu sucessor com muita expectativa. Seria muito melhor que o Vaticano fosse mais claro e transparente e que as nomeações de bispos fossem feitas, não diria com a participação democrática, mas com uma participação mais fraterna, pois a fraternidade é maior que a democracia.

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