quinta-feira, setembro 03, 2009


O sexo inferiorizado

O medo da sexualidade feminina que se quer exprimir de forma libertária/emancipada é, obviamente, muito anterior às religiões abraâmicas, estando fortemente implantado, desde tempos imemoriais, nas sociedades patriarcais. Provavelmente advém da insegurança instintiva de os homens nunca saberem ao certo (pelo menos antes dos testes de ADN) se são os pais biológicos das crianças que ajudam a criar. Em termos evolutivos, parece desastroso investir tanto em seres que não carregam o nosso legado genético. ( Atenção que, racionalmente, sou 100% a favor da adopção de crianças!) O facto de as mulheres terem uma vida sexual mais longeva e serem potencialmente multiorgásmicas (sem que os seus orgasmos tenham grande influência no processo de fecundação) e poderem receber o sémen de muitos parceiros sexuais (sendo possível terem sexo, forçadas ou não, mesmo sem estarem excitadas sexualmente), faz com que muitos machos tentem “cortar o mal (dos apetites sexuais femininos) pela raiz”, tanto em termos culturais (coerção psicológica) como até físicos. É por isso que diariamente em cerca de 23 países africanos continuam a excisar (o clítoris) de umas 6 mil meninas - muitas das quais morrem de subsequentes infecções. Comummente este procedimento bárbaro é complementado com o corte dos lábios vaginais que de seguida são cosidos (com espinhos), de modo a deixar apenas uma abertura mínima que assegure a expulsão da urina e do fluxo menstrual (chama-se a isso infibulação). Assim fica garantida a virgindade!... Imagine-se as terríveis dores que as sobreviventes têm ao iniciar a sua vida sexual (em conformidade com alguns seguidores do Corão). Em países como a Etiópia e o Sudão, entre outros, um elevado número de mulheres acaba por perecer ao tentar “dar a luz” como resultado destas práticas que as autoridades de 16 países se comprometeram protocolarmente a combater, mas que insistem em fingir ignorar (…)
Em 2006 um tribunal estado-unidense condenou um cidadão de origem etíope (que reside com a sua família nos EUA) a 10 anos de cárcere por, na privacidade do seu lar, ter excisado o clítoris da sua filha quando esta era um bebé de 2 anos (na altura do julgamento a menina tinha 7 anos), segundo os preceitos em que fora educado. A inusual severidade desta pena certamente que se destina a fincar um exemplo de tolerância zero quanto a estas práticas em terras do Tio Sam, amedrontando todos os que ainda acreditam na necessidade de mutilar as meninas, comprometendo toda a sua vida sexual e desobedecendo as leis do império. (Por outro lado, poucos acreditarão que, se algum estado-unidense filho de um proeminente político ou industrial for apanhado a furtar num país muçulmano ultra conservador, a pena habitual para estes tipos de delitos – a amputação da mão – será aplicada….)
Na caça às bruxas medievais, ter os lábios vaginais e/ou o clítoris grandes, era considerado um comprovativo de que estavam a lidar com um estrigídeo ao serviço de Satã.
Estranhamente, ainda hoje o clítoris quase não é merecedor de figurar em tratados de medicina.
O clítoris é um órgão muito maior do que se supõe (estando quase todo oculto à volta da vagina) composto por mais fibras nervosas do que o pénis; a sua única função é a de dar prazer e, após o orgasmo, não é afectado por um relaxamento muscular acompanhado de uma diminuição do afluxo sanguíneo (como acontece ao pénis), o que lhe permite provocar orgasmos múltiplos (embora possa ficar excessivamente sensível como para continuar a ser estimulado, provocando um desconforto doloroso). Para algumas culturas misóginas, tal capacidade feminina (digna de admiração, digo eu!) apenas contribui para o mito da ninfomaníaca fora de controlo (masculino)…

Um dos principais precursores da medicina ocidental, Hipócrates, associava as mudanças de humor e as doenças femininas à sexualidade, conjecturando que o útero era um órgão maligno e errante, capaz de se deslocar do seu sítio certo no baixo ventre para errar pelo corpo, provocando doenças em cada órgão que embatia…
Milhares de anos depois, o pai da psicanálise, Sigmund Freud, tinha algumas ideias deste calibre em relação às mulheres; eis algumas delas: «o orgasmo clitoriano é infantil»; «as mulheres só ultrapassarão a sua ansiedade crónica e desequilíbrio emocional [constituídos por um rosário de fanicos e de caprichos] quando aceitarem a sua condição de inferioridade [inata] em relação aos homens»…
aqui vai mais uma pequena amostra do que proeminentes teólogos vaticinaram sobre as mulheres:

"A mulher está em sujeição por causa das leis da natureza, mas é uma escrava
somente pelas leis da circunstância...A mulher está submetida ao homem pela
fraqueza de seu espírito e de seu corpo...é um ser incompleto, um tipo de
homem imperfeito [...] A mulher é defeituosa e bastarda, pois o princípio
activo da semente masculina tende à produção de homens gerados à sua
perfeita semelhança. A geração de uma mulher resulta de defeitos no
princípio ativo. » - Tomás de Aquino (in Summa Theologica, Q92, art. 1, Reply Obj.
1)


No século XII, Graciano, especialista em direito canônico, afirmou: "O homem,
mas não a mulher, é feito à imagem de Deus. Daí resulta claramente que as
mulheres devem estar submetidas a seus maridos e devem ser como escravas.»


"Abraçar uma mulher é como abraçar um saco de esterco. » - (São) Odo de Cluny
(monge beneditino, 1030-1097)
De S.Clemente de Alexandria sobre as mulheres: "A exata consciência de sua
própria natureza deve evocar sentimentos de vergonha. » (Paedagogus II, 33, 2)

Santo Antonino, arcebispo de Florença no final do séc. XV, diz que as "imundas
regras" são simplesmente o espelho de uma "alma imunda"

(S.) Agostinho colocou o dedo na ferida da fraqueza masculina (heterossexual) na sua luta contra os instintos:
«As mulheres não deveriam ser educadas ou ensinadas de nenhum modo. Deveriam, na verdade, ser segregadas já que são causa de horrendas e involuntárias erecções. »


A reforma protestante, de início, trouxe poucas melhorias para a libertação das mulheres, já que o líder desse cisma religioso, Martinho Lutero também era profundamente misógino. Eis algumas das suas “pérolas de sabedoria” machista:


«Não há maior defeito numa mulher que o desejar ser inteligente. »
«Os homens têm tórax grande e largo, quadris estreitos e mais entendimento que
as mulheres, que têm tórax pequeno e estreito e quadris largos. Isto significa
que elas devem ficar em casa, sentar-se quietas, cuidar do lar, gerar e criar
crianças. »
A sua conclusão doutrinária (tida como um dogma) mais devastadora foi a de que «As palavras e actos de Deus são bem claros: as mulheres foram feitas para ser esposas ou prostitutas» ...

Até os protestantes utilizaram o manual de caça às bruxas conhecido como "Malleus maleficarum" ("Martelo das feiticeiras"), que foi encomendado pelo Papa Inocêncio VIII a dois tenebrosos teólogos académicos chamados Heinrich Kramer e Jakob Sprenger. A sua publicação data de 1486 e vigorou por 250 anos. O livro afirma, entre outras coisas, que: "Quando uma mulher pensa sozinha, ela pensa maldades . (...) «Elas
são mais fracas de espírito e corpo (...)As mulheres são, intelectualmente, como
crianças (...)As mulheres têm memória mais fraca e é um vício natural nelas
não serem disciplinadas mas obedecerem a seus próprios impulsos sem noção
do que é apropriado" «A mulher é uma mentirosa por natureza...Ela é uma
inimiga insidiosa e secreta. » (...) «Se uma mulher se atreve a curar sem ter estudado,
ela é uma bruxa e deve morrer. » (quando um homem curava, era pelo poder de Deus
ou dos santos; quando uma mulher curava, era obra do diabo) «Ninguém causa
maior dano à fé católica do que as parteiras" (porque conheciam métodos de
parto sem dor, o que contrariava o mandamento de Deus de que as mulheres
deveriam dar à luz com dor; se não doesse, o diabo estava agindo) «E convém
observar que houve uma falha na formação da primeira mulher, por ter sido ela
criada a partir de uma costela recurva, ou seja, uma costela do peito, cuja
curvatura é, por assim dizer, contrária à retidão do homem. E como, em
virtude dessa falha, a mulher é animal imperfeito, sempre decepciona e mente. »
O livro trazia instruções detalhadas sobre métodos de tortura para se
obterem confissões, terminando as vítimas totalmente estraçalhadas (mas com
o devido cuidado para que sobrevivessem para serem queimadas na fogueira, com a
língua cortada para que não blasfemassem diante do povo).


E está escrito no Talmud: «A mulher é um vaso cheio de imundícies com sua boca cheia de sangue e entretanto todos a desejam» (Shabbath 152) «Quando nasce um menino, todos se alegram mas quando nasce uma menina todos se entristecem» (Niddah 31)

Numa reza matinal que já foi muito popular entre os casais judeus, cabe ao homem dizer o seguinte: «Obrigado, Senhor, por não ter nascido mulher», ao
que sua mulher responde: «Obrigada, Senhor, por me terdes feito de acordo com
sua vontade. »

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