sexta-feira, setembro 04, 2009


“Alternativos”



Haverá por aí pessoal verdadeiramente alternativo empenhado na luta por uma alter globalização, mas que não coma parvoíces “místicas” e pseudo esotéricas, estilo comida rápida para ocidentais alienados, privilegiados, egoístas e fúteis?! Falo das tretas execráveis New Age; a astrologia; os calendários “Maia” e “Celta”; os “atlantes”, as fadas e os anjos – seres mitológicos todos com o aspecto de caucasianos que parecem ter saído de um catálogo de eugenia nazi (porra que até os seus gnomos canabinóides têm os olhos claros!)… Enquanto, não muito longe de nós, diariamente, em média, morrem 30 mil crianças devido à desnutrição e à nossa indiferença! Mas esses têm a pele escura e, como tal, são demasiado “inferiores” como para terem direito à guarda pessoal de “anjos”… Não é assim, rebanho cego?
E Misturam Vedas com citações filosóficas atribuídas a “índios estadunidenses” – que eles consideram culturas extintas, apenas se apoderando de imitações folclóricas e comerciais do seu misticismo.

Aliás, ao considerarem coisa do passado os povos tribais, ficam “escusados” de se envolverm na luta política (preferencialmente apartidária) em prol dos directos (constantemente atropelados!) de milhões de pessoas pertencentes a grupos étnicos que têm sido empurrados para debaixo do tapete desta civilização,onde “podem” ser espezinhados obscuramente.



Há ainda os “gurus” charlatães e manipuladores que debitam desbotados litotes e mantras embrutecedores (em workshops/oficinas de trabalho extorsionários e que prometem resultados imediatos aos neófitos…) sobre um oriente romantizado; os “leitores de áureas”; os que fodem com “extraterrestres”; os “iluminados” que promovem o consumismo esverdeado e sucedâneos reciclados das religiões abraâmicas ; a infantilidade (no pior sentido da palavra) estilizada e parasitária da cultura nórdica que foge do frio mantendo ares de “superioridade” decorada com arco-íris, unicórnios, duendes, girassóis, borboletas, colibris,… sem que consigam identificar no campo as verdadeiras espécies iconografadas.
“Adoram” a natureza sem se molestarem em tentar compreende-la verdadeiramente. Quando no campo, passam a maior parte do tempo com o olhar confinado aos seus brinquedinhos electrónicos, enquanto debitam um chorrilho de clichês imbecis das suas cartilhas urbano-utópicas, em que, hipocritamente, projectam na natureza valores morais dúbios; julgando os bichos pelo que mais detestam na nossa sociedade sob o peso ingente da cumplicidade. Querem fazer festinhas nos animais silvestres (os que tem um aspecto fofinho) e são tão egocêntricos e supersticiosos que acreditam que essas criaturas sabem reconhecer os humanos de “energia superior!” e mal podem esperar para lhes caírem nos braços, trocando afectos... já encontrei alguns (adultos!) que acreditam que os Flingstones são um retrato fidedigno da pré história!

os livros de merda que esta gente le só seriam úteis em cagatórios de apiadeiros indianos. Coisas como, por ex., «A Profecia Celestina»; os do Paulo Coelho; até «O Código da Vinci»; “ O Zen do seu Automóvel” e outros títulos possíveis do gênero:
“A Transumância da Alma no Alinhamento Cósmico da Era do Gambuzino”; “Meditação Transcendental para Impedir o Crescimento das Ervas Indesejáveis no seu Jardim & Horta”; “A Espiritualidade Monetária para Alcançar a Pan Sexualidade dos Bonobos ”; “Reinventar o Galo de barcelos no Contexto da Cultura Xamânica” ;
“Tratado Psicográfico de Magia Teúrgica Aplicado à Dieta Macrobiótica”; "Programe o Nascimento dos Seus Filhos de Acordo com o Mapa Astral dos Famosos"; “Guia das Viagens na Maionese (Chegando sempre a Tempo de ver o Thongdrol)”;"Reiki para Lavar as Partes Pudibundas (Sem Precisar de Tocar Nelas)"; "Oui Ja: Aprenda a Conjurar o Mestre Nostradamus e Ganhe nas Raspadinhas"; “O Portal Interestelar da Quinta da Conraria (com Ligação ao Ramal do Triângulo das Bermudas) e a Conspiração dos Illuminati para Devolver o Brinde ao Bolo Rei”; “Confissões do Anjo que Enrabou a Virgem Maria com um Ceptro Merovíngico”; “Como o Feng Shui @ Poderá Ajudar Reduzir o Peso da Sua Alma (de 21 para 19 gramas) em Apenas Uma Semana”;"Atinja o Nirvana Através de Trepanações e lobotomias "; "Os Mantras Rectais do Bonnacon"; “A Influência Emenagoga do Ninhal Lunar de Psicopompos”; “Como reencarnar num Golfinho Recorrendo aos Cristais Atlantes”; “Manual Devadasi para Neutralizar o Chupacabras ” etc,etc... Usem a Imaginação e divirtam-se! Até eu estou a pensar escrever um livro meio esotérico, ou não, intitulado “Blasphemare Absens Fides II : O Homem que Escarrou na Cara de Jeová e Sobreviveu para que o Seu Biógrafo Escrevesse a Estória.” Que tal, ein?...


Nem sei se ria ou se chore confrontado com as suas teorias (tão monolíticas quanto lamechas) sobre a visão “melhorada” da natureza, mais se assemelhando a um cruzamento entre zardins zoológicos e parques temáticos estilo Walt Disney. Testemunhas de Jeová e quejandos sentem-se igualmente confortáveis com estes conceitos controlados pela Megamáquina… Esse bando de velhinhas (mesmo que os seus documentos de identidades atestem o contrário) não raro forçam os seus cães e gatos a uma dieta vegetariana! E acham que ter tartarugas num tanque de quintal, ou passarinhos a esvoaçar esporadicamente dentro de casa, é um acto de bondade!...
Oh, e como irrita os ares de superioridade que exibem ao falar sobretudo da sua espiritualidade e das suas dietas – que tentam impingir com fúria doutrinária, mesmo quando se entregam ao consumismo fútil, apoiando as instituições/corporações com o pior historial de agressão à natureza...
E sonham com uma aliança entre o Greenpeace e Jesus Cristo (versão amaricada, com uma sedosa cabeleira cor-de-mel e olhos de um azul profundo) comandando um exército de anjos armados até aos dentes; apoiados por uma esquadra de fadinhas e ninfas lideradas por Peter Pan; O Sai Baba e o Michael Jackson de mãos dadas com crianças (que perderam a inocência da pior maneira); o Dalai lama e Buda (numa tanga de lutador de sumo), rodeados por monges de Shaolin; Gandalf e Merlin à frente de um grêmio de druidas e de bruxas (que mais parecem modelos da Avon, ou então dão azo à longa tradição dos estereotipados preconceitos anti-semitas ), respaldados pelos cavaleiros da Távola Redonda e pelo bando de Robin dos Bosques; o fantasma de Chico Mendes e de índios cujos nomes foram imortalizados por Hollywood – onde as estrelas nos enviarão os seus professores de ioga e de reiki para o confronto final entre o bem e o mal... haverá ainda naves espaciais, em que os alienígenas dividirão a sua mirabolante tecnologia com os hackers mais craques e ousados. Esses irão salvar o mundo in extremis.
Entretanto, vão-se entupindo com Coca-cola e Marlboro e luzem modelos XPTO de botas para trekking que a NASA desenhou a fim de que nunca percam a tracção nos pedais dos jipes (e a ninguém interessa que tenham sido fabricadas por crianças e adolescentes em condições deploráveis lá longe no Terceiro Mundo, que isso de ser fundamentalista certamente não nos conduz ao Nirvana...)



Não nos podemos esquecer dos discípulos do “mestre LSD” Timothy Leary que nutrem uma fantasia tecnófila e elitista. Mais do que Paracelso (que teve o duvidoso “mérito” de transformar grande parte dos europeus em antropófagos…)e a sua pretensão clínica de que a natureza foi criada para nos servir ( nomeadamente na fitoterapia, argumentando que morfología de diversas partes das plantas supostamente nos dá fáceis pistas sobre as suas propriedades medicinais de acordo com as semelhanças antropomórficas), estes arautos da Nova Era consideram-se a mente, a conciencia e o espírito do planeta vivo, a que gostam de chamar Gaia. Como agravamento de tais delírios de grandeza antropocêntricos , sentem a obrigação “moral”, assim como uma demanda “espiritual”, de pegarem no seu punhado de escolhidos e partirem para o espaço sideral, a fim de colonizarem outros mundos “sáfaros e sequiosos” da sua energia “superior”, pois consideram-se demasiado “evoluídos” para as limitações naturais deste planeta – o único a que podemos chamar o nosso lar. Na sua hierarquização da natureza, reservam um pedestal para a humanidade – na verdade, apenas para uma auto eleita elite em processo de deificação. (Quem ficará responsável pela selecção da alegada “nata da humanidade”? Em que critérios se basearão? A concretizar-se, não restam dúvidas que tal operação deverá ser coordenada por um “grande líder” que apenas tolerará junto de si, na nave espacial, os que tenham com ele uma sintonia política… )
Tão certo como esta ser uma versão de velhas utopias de cariz bíblico, é um facto que eles estão a fazer o jogo do complexo militar-industrial (e os seu verdadeiro deus – o capital), que pretende continuar a expandir-se, exaurindo os recursos das biorregioes que vão deixando para trás até que não haja o que predar para além da conquista espacial.
Alguns até são malta porreira, mas andam tão desorientados... Enquanto assim for, os poderes instituídos podem empanturrar-se – vampirando-nos e deixando um rasto de destruição ambiental – bem descansadinhos…
Muitos estão viciados na barulheira ensurdecedora, com as respectivas luzes mesmerizantes, velocidade vertiginosa e drogas de síntese química que levam para o campo molestando com gravidade tudo o que lá vive – e que não de dão ao trabalho de conhecer. Chamam a isto “música transe” e “comungar com a natureza”…Puta-que-os-pariu !!
Esse comércio de indigência intelectual e espiritual não me parece que tenha contribuído positivamente para o desenvolvimento e consolidação da ecologia e do respectivo activismo.
Precisamos de redescobrir e recrear uma espiritualidade telúrica e solidária, ou seja, um estado de encantamento radical (no verdadeiro sentido da palavra) perante a natureza, amando e respeitando todas as criaturas que habitam connosco este planeta maravilhoso, mas que já não reconhecemos como nossos parentes nem como garantes da nossa qualidade de vida e até da nossa mera sobrevivência.
Devemos olhar atentamente para as comunidades tribais que ainda subsistem tentando resistir à merda da nossa civilização – ao capitalismo rapace; ao urbanismo industrial; ao mercado de trabalho arregimentado e à tecnologia de exploração desumanizante; à corrupção completa da verdade; à competição desenfreada e às hierarquias injustas que o dinheiro impõe; ao Estado autoritário ao serviço das corporações; ao isolamento desesperante sob o fluxo suicidário das massas manipuladas; aos ambientes tóxicos (em termos físicos e intelectuais); à alienação aditiva e todas as dependências malsãs; ao hedonismo irresponsável; ao egocentrismo desenraizado; à passividade aliada à insaciável fome materialista que aborta sonhos envenenados; à homogeneização imposta das afirmações de “progresso” baseadas na destruição do que há de mais precioso; ao crime; às doenças e à iniquidade generalizada; às ideologias que justificam assimetrias sociais; à privatização da vida,…

Esses povos tribais são os guardiães dos valores redentores que nos poderão ajudar a criar comunidades sustentáveis, harmoniosas e tão felizes como é possível à nossa espécie – que assim viveu durante 99% da sua existência.

A propósito, aqui fica um excerto de uma entrevista a Jerry Mander (um autor altamente recomendável!):

INGRAM: Let's talk about virtual reality.

MANDER: I've never experienced virtual reality. I'm very skeptical about it. I think it's like every other technology in the sense that it has some entertainment value and maybe it has some interesting uses. I've heard that a new use for virtual reality programs is in training bomber pilots. Aside from such uses, which I find disturbing, what annoys me is the way virtual reality is embraced and celebrated by those who ought to be smart enough to see their way out of this technological maze.
INGRAM: You mean the new age crowd.

MANDER: Yes, it's such a sign that the new age has misunderstood something about itself. Proponents of the new age place primary value on the expansion of human consciousness toward some apparently higher level of understanding. They regard human beings as the ultimate expression of evolution, and they regard themselves as the explorers or the astronauts of human consciousness, trying to develop human abilities and live up to their maximum human potential. Such a view justifies any technological or even political development if it somehow is supportive of the drive toward expanding human consciousness. That's why the new age so favors space exploration and almost any other technology that offers new games, new ideas, new capabilities for human expression without any sense of the political or social consequences.

For example, a lot of new age proponents claim to celebrate Indians but they're truly celebratory only of what they think is Indian mysticism, without any appreciation of where that comes from, how that's rooted in community, in the earth, and in egalitarianism. Their interest in Indian spirituality attaches no importance to the political situation that native peoples face on the planet. If the knowledge of native peoples is going to be preserved, then you have to get involved politically to help them. And new age types are not interested in that; they're interested in skimming what they regard as the cream--the mystical aspects, the peyote rituals, or maybe the art. This is just personal aggrandizing, ego-oriented self- indulgence. It is politically right-wing and very counterproductive to the ideals of a survivable, sustainable world, and healthy human consciousness. It sustains a value system that is causing the problems. That kind of new age thinking is, to me, revolting.

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