quinta-feira, abril 12, 2007

Henry Ford, conhecendo bem a perversidade do sistema industrial-capitalista que ajudara a implementar, disse que: «há 2 maneiras de levar as pessoas a trabalhar: a apetência pelo salário e o medo de o perder.»

Entretanto, sem suscitar a atenção dos jornalistas (que, nos EUA, maioritariamente estavam empregados por amigos seus), este magnata apoiou intensamente a ascensão política de Hitler e do seu partido nazi-fascista, fazendo com que as maiores corporações estado-unidenses beneficiassem de trabalho escravo proveniente de campos de concentração. Mesmo na “terra das oportunidades”, Henry Ford contratou um bando de “gorilas” (a maioria dos quais ex-presidiários) para intimidarem e espancarem todos os trabalhadores que estivessem ligados a actividades sindicais, ou simplesmente para manter o ritmo de produção elevadíssimo.

Até Isaac Newton, cujo nome ficou para a posteridade emoldurado no título de «benfeitor da humanidade», inventou um sistema de choques eléctricos para espevitar os seus empregados e colegas (assim reduzidos a híbridos de reses e de autómatos da produção capitalista) no posto de trabalho. Durante o curto período que durou esta experiência, mereceu aplausos por parte da elite. Agora basta-lhes condescenderem em reconhecer a encenação formal do bem policiado direito à greve, ou então, concentram as suas unidades de produção em Zonas de Produção Especial, que são infernos sociais e ambientais, ligados a governos corruptos e repressivos…

O grande desenvolvimento económico que se verificou na ex-URSS no início da Guerra Fria, deveu-se à mão d’obra escrava concentrada nos gulags de Estaline (que fizeram mais vítimas do que os campos de concentração nazis, mas sem suscitar a mesmo interesse moralista, compaixão e indignação do resto do chamado “mundo livre”).

Nem é preciso ir tão longe. Aqui ao lado, em Espanha, Franco negociou o trabalho de dezenas de milhar de prisioneiros políticos com empresas nacionais que assim reconstruíram a Espanha reduzida a escombros (devido à guerra civil), enriquecendo e tornando forte a economia do país mesmo antes da adesão à União Europeia.

Perto de 500 mil espanhóis passaram por mais de 100 campos de concentração. A “magnanimidade” do caudilho perante os republicanos, liberais e progressistas - que pretendeu erradicar da face da terra (com a bênção, ou seja, a cumplicidade activa, da Igreja Católica, que legitimou esse projecto genocida ao declará-lo uma «cruzada») – mostrou-se com a oferta da redução de 2 dias da pena de cárcere por cada dia de trabalho para o Estado e para as empresas em conluio. (Os que trabalharam no faraónico mausoléu chamado «Vale dos caídos», chegaram a ver essa redução de pena numa relação de 1 para 6 dias.) Da miséria que os prisioneiros recebiam das empresas, 76% era rapinado pelo Estado. Tal rendeu ao Estado o equivalente hodierno a 610 milhões de euros (e isto são números obviamente modestos porque foram fornecidos pelos militares).

Tal como nas unidades fabris de Auschwitz se podia ler o slogan monstruosamente sarcástico «o trabalho liberta-nos», Franco justificava publicamente o referido programa de “reabilitação” nos seguintes termos:«[é necessário] redimi-los da sua existência de párias através do trabalho.» (…) «Os que eram os despojos de Espanha, tornaram-se pessoas úteis.»

Muitos milhares foram assim mortos pelo trabalho forçado. Os sobreviventes continuam vítimas de um pacto de silêncio entre as forças políticas que emergiram e ascenderam ao poder após a morte de Franco; unanimemente, concordaram que esse seria um preço pequeno a pagar pela estabilidade dos militares com os dedos nervosos nos gatilhos…

Ironicamente, foi a “democracia” que condenou os sobreviventes dos campos de concentração espanhóis a tornarem-se párias históricos… Estes prisioneiros (incluído mulheres e crianças) que, em muitos casos, chegaram a conquistar a admiração dos seus algozes, devido às demonstrações de dignidade estóica e de integridade idealista, deixando florescer a solidariedade e até o sentido de humor, onde parecia só haver espaço para a dor, o desespero e a amargura, actualmente vivem com o seu terrível passado obliterado para que as “consciências democráticas” possam continuar mergulhadas no “sono dos justos”… A juventude nem sequer acredita nas estórias destes velhotes sem direito a reivindicarem uma memória colectiva feita de horrores que deveriam servir, não para vinganças, mas, pelo menos, para alertar aqueles que acham que a democracia é um dado adquirido inalienável.

Existem mais escravos hoje em dia do que em qualquer outro período da história. Estima-se que o seu número se situe entre 40 a 80 milhões. As suas vidas são menos valorizadas do que as dos africanos capturados e comercializados pelos esclavagistas europeus há quatro ou cinco séculos, porque são muito mais facilmente substituíveis;

As corporações têm um poder que humilharia qualquer ditador, pois não há um único recanto do planeta que esteja a salvo da sua ganância rapace; os seus saques são legitimados pela Organização Mundial do Comércio (com a ajuda do banco Mundial e do FMI, além das forças armadas que obedecem a governos corruptos), colocando-se acima das legislações de cada país e do direito à auto determinação dos povos – começando pela sua independência económica e redistribuição equitativa da riqueza.

PB

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